sábado, 26 de janeiro de 2013

Músico por prazer,Marky Ramone diz, não gravo mais disco


David Shalom/Direto de S.P/Terra
No ano passado, o vocalista do Sisters of Mercy, Andrew Eldritch, afirmou em entrevista ao Terra que a decisão de se recusar a gravar um novo disco era devida, principalmente, à crise cada vez mais aguda no mercado fonográfico. Por motivos diferentes, outro famoso cinquentão, o baterista Marky Ramone, adquiriu a mesma postura nos últimos anos. Figura constante nos palcos da América do Sul, o músico de 56 anos volta ao Brasil para uma série de três shows - em São Paulo, no sábado (26), no Manifesto Bar; no Motorcycle Rock Cruise, cruzeiro dedicado ao rock que ocorre a partir de 30 de janeiro; e em Americana, no dia 2 de fevereiro.

"Eu só não quero mais um disco com as falhas que eles costumam ter. Quero que todas as canções soem bem individualmente, por isso não os gravarei mais", explicou com exclusividade ao Terra Marky, conhecido por seu trabalho nos Ramones entre os anos de 1978 e 1996, e atualmente líder do quarteto Marky Ramone s Blitzgrieg, que lançou, respectivamente, em 2010 e 2011, as canções When We Were Angels e If and When. "Já tenho inclusive um novo single, que deve ficar pronto assim que eu voltar da atual turnê. Quando eu tiver 14, 15 singles, colocarei tudo em uma compilação e pronto."

Desde o fim aos Ramones, em 1996, Marky trabalhou em inúmeros projetos, tanto próprios, caso de Marky Ramone & the Intruders e Marky Ramone & the Speedkings, quanto de amigos músicos, incluindo estilos diversos, que foram do punk ao blues. Ativo há mais de dois anos, o projeto atual, no entanto, tem um destaque: a presença entre seus integrantes de outro grande nome do punk rock norte-americano, Michaele Craves, vocalista do The Misfits entre os anos de 1995 e 2000.

"Eu queria um cantor que tivesse seu próprio estilo e Craves tem isso, canta de uma forma muito particular", explicou o músico sobre a escolha do vocalista, a quem, em um meio fechado como o do punk rock nova-iorquino, conhece há muitos anos. "Além de frontman, ele foi o principal compositor do Misfits por três, quatro anos, escreveu discos com grandes vendagens, então achei que fosse o cara com a experiência certa. Foi simples assim."

No período que sucedeu o fim dos Ramones, Marky também chegou a trabalhar com os ex-colegas de palco Dee Dee e Joey Ramone em seus discos solo. Com este último, gravou a bateria de cerca de 50% das canções do primeiro e único álbum solo do vocalista, Don t Worry About Me, lançado quase um ano após sua morte, em 2002 - o restante das batidas ficaram a cargo de Frank Funaro (Del Lords/The Dictators) e Dr. Chud (ex-Misfits).

"Joey saía do hospital, me encontrava no estúdio, me mostrava as linhas de bateria com o guitarrista Daniel Rey e os vocais e, depois de tudo isso, ele precisava voltar ao hospital, porque estava muito doente para ir para casa", lembrou o baterista, ressaltando as dificuldades de se produzir o disco no momento em que Joey enfrentava uma das piores fases do tratamento contra um câncer nos vasos linfáticos, que acabou matando-o no ano seguinte. "Ao menos o sonho de Joey de fazer um grande álbum solo se tornou realidade."

O trabalho póstumo do ex-colega, que incluiu uma versão para o eterno hit What a Wonderful World, foi um estrondoso sucesso. Assim como foram, a partir do mesmo período, as vendagens dos antigos discos dos Ramones, algo estranho pelo fato de o grupo ter encerrado as atividades em um período de baixa popularidade. "Assim é a vida, sabe? Por alguma razão, quando as pessoas morrem, seu legado, seus discos, sua própria lenda se tornam maiores", teorizou Marky. "Mas não foi só devido a isso. Naquela época, uma nova geração sedenta por punk apareceu por aí, graças ao surgimento de bandas como Green Day e Rancid. Assim, os novos fãs queriam saber quem tinha influenciado esses caras e, naturalmente, acabaram descobrindo os Ramones."

Mesmo com um final de carreira difícil, os anos dourados nos Ramones deram a Marky um estilo de vida confortável que ele consegue manter até hoje. Tanto que o baterista garante não ter qualquer necessidade de continuar fazendo turnês, atividade que atualmente vê muito mais como um hobby do que como um trabalho propriamente dito. "Basicamente, continuo tocando por prazer. Amo isso, viajo pelo mundo todo, então, sabe, é como um sonho. Foi para isso que me preparei desde criança, ainda no ensino fundamental, porque eu odiava a escola, odiava os professores, odiava as crianças, odiava a todos. Por isso, sempre disse para mim: continue tocando, ensaie e você colherá os frutos mais tarde.

Brazuca

A relação de Marky com o Brasil já é bastante antiga. Isso é tão verdade que o baterista sequer consegue enumerar o número de vezes - pelo menos uma dezena - que veio ao País nos últimos nos últimos anos. Entretanto, o envolvimento com os brasileiros é muito mais profundo do que a tradicional relação artista-fã, responsável por gerar exaltações de músicos internacionais do tipo "a enorme paixão do público, a excelente culinária e a beleza da natureza e da cultura do povo local" - frases do próprio Marky.

Entre o final da década de 1990 e o início da de 2000, o músico fez parcerias com duas bandas locais. Em 2002, gravou uma faixa do disco Punk até os Ossos da banda gaúcha Tequila Baby, voltando a tocar com ela dois anos depois, em um pequeno giro em homenagem aos Ramones. Meses antes, se envolveu em uma empreitada maior: foi convidado pelo então popular quarteto Raimundos para participar de uma faixa do disco Éramos 4, o primeiro sem Rodolfo Abrantes nos vocais.

"Mas não foi legal", lamentou o segundo caso. "Sei lá, tive um dia divertido com eles, mas, quando fui ouvir o resultado, não achei bom. Sabe, realmente não gostei do disco, da forma como ele soa, de seu groove. Talvez eles tenham ficado nervosos por tocarem comigo, não sei, mas tenho que ser honesto em relação a isso. Eu poderia dizer que ficou ótimo, mas não. E não foi a mixagem ou a produção, foi a falta de qualidade deles tocando."

Morto-vivo

Se gravar discos próprios não faz mais parte de seus planos e as turnês se tornaram apenas um grande e feliz hobby, será que Marky simplesmente abandonou a possibilidade de novos planos? A resposta é um empolgado não. Assim como fizeram outros colegas do meio roqueiro como Gene Simmons, Ozzy Osbourne e Rob Halford, o baterista vê a cada dia uma vontade crescente de se dedicar à carreira cinematográfica, a qual foi iniciada em 2002, com o longa The Brooklin Boys, e abandonada na sequência.

"Quero muito atuar e vou fazer isso", garantiu, citando uma produção, ainda sem título, que começará a filmar em março, em Porto Rico. "Querem que eu interprete um zumbi. Então, lá estarei eu, sendo maquiado, colocando todas aquelas próteses de borracha e marcas de sangue no rosto e virando monstro."

E quando poderemos ver Marky encarnando um morto-vivo sedento por miolos humanos? Aí entra a atitude punk que fez do baterista um legítimo Ramone: tudo o que me disseram foi o seguinte: apareça, coloque uma borracha no rosto e até março. Então vamos aguardar, concluiu aos risos. 

Baterista de 56 anos posa durante sessão de autógrafos em Bogotá, Colômbia, em 2011 Foto:  / AFP

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