quinta-feira, 11 de maio de 2017

ESTREIA–“Alien: Covenant” mescla horror com duelo de androides




De várias maneiras, a ficção científica “Alien: Covenant”, de Ridley Scott, pode ser visto como um comentário simbólico sobre nossos tempos – talvez até mesmo à sua revelia.

Retomando personagens criados por Dan O’Bannon e Ronald Shusett, com roteiro de John Logan e Dante Harper, explora-se a história de uma semente do mal ser propagada, incubada e levada a invadir corpos – até de pessoas boas, talentosas e bem-intencionadas, tudo isso sendo o plano de um ser não exatamente humano, embora guarde toda a imagem e semelhança com um.

Evidentemente, sabemos desde “Alien, o Oitavo Passageiro” (1979) – do qual este filme é a segunda prequel – que algo deu tremendamente errado neste plano com aparência de perfeição programada, a partir de uma busca da criação com total controle.

Nesta fantasia gótica, há muitas referências indiretas ao nazismo – e a preferência de um dos personagens pela (bela) música de Richard Wagner não há de ser a mais velada.

Na verdade, essa dimensão cósmico-histórica do roteiro é um dos aspectos mais interessantes, ousados e estimulantes de uma obra que, afinal, poderia não passar de uma aventura – e há momentos gore suficientes para nos lembrar que se trata também de um filme de gênero que busca o entretenimento e não teme o horror de algumas situações (negá-lo seria trair o próprio espírito da saga, afinal).

Há uma tentativa de replicar a figura da inesquecível tenente Ripley (Sigourney Weaver) da saga Alien através da capitã Daniels (Katherine Waterston) – ou seja, uma mulher, líder e sem perder a ternura (e ter começado o filme com uma viuvez é sintomático). Mas as perdas assinalam também o caminho de outros personagens aqui, empatando o jogo e mantendo à tona um mínimo de identificação humana da plateia com estes personagens em situação tão extraordinária.

A contraposição vai ser o jogo entre dois androides, ambos interpretados por Michael Fassbender, defendendo o personagem mais complexo da trama, David – moldado à perfeição da estátua de Michelangelo, versado na música clássica e na poesia romântica inglesa mas uma esfinge de contradições, que lhe permitem jogar contra Walter, o outro androide, o duelo do bem e do mal mais complexo do filme.

Interpretados pelo mesmo ator, os dois são como a dupla face de Jano, que na mitologia romana tem duas faces e está associado a todos os começos. E David, certamente, está à altura de outro androide inesquecível, Roy Batty (Rutger Hauer), de “Blade Runner, O Caçador de Androides” (1982), ao lado de “Alien, O Oitavo Passageiro” os títulos assinados por Scott que redefiniram a ficção científica há mais de 30 anos atrás.

Produzindo e dirigindo mais uma vez um filme da saga que tem a sua marca, Ridley Scott, às vésperas dos 80 anos – a serem completados em novembro - mostra-se à altura do desafio. Realizou um filme que entretém, nunca entedia por sua duração (122 minutos) e responde suas perguntas (sem explicar demais nem perder o ritmo, como aconteceu com a primeira prequel, “Prometheus”, de 2012) – deixando aberta, é claro, a porta às suas continuações, podendo render até uma nova trilogia, segundo o próprio Scott.

(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb

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