Aos 90 anos, o médico americano Kenneth Cooper conquistou rios de dinheiro ao longo da vida ao defender a corrida como principal aliado da longevidade e do condicionamento físico. Criado no fim da década de 60 para ser usado pelas forças armadas, o chamado “método cooper”, consistia na prática de corridas de doze minutos para avaliar o desempenho de atletas. O hábito imediatamente conquistou pessoas comuns que começaram a correr em todos os cantos do planeta. Correr se tornou sinônimo de boa forma e saúde.
Só muito recentemente o cenário começou a mudar, com estudos desvendando o impacto positivo da caminhada. Aos poucos, viu-se que os benefícios dos passos mais lentos podem ser tão bons ou melhores que os ligeiros. Pois agora um trabalho quantifica com exatidão o quanto se deve caminhar para que o corpo sinta os efeitos. Pessoas que andam mais de 7 mil passos todos os dias têm de 50% a 70% menos risco de mortalidade. Este é o resultado de um trabalho conduzido por pesquisadores da Universidade de Massachusetts, nos Estados Unidos, e publicado na prestigiosa revista científica Jama Network.
Dar 7 mil passos diariamente é o mesmo que percorrer de 4km a 5km, a depender da altura da pessoa. Apesar de a distância ser um pouco assustadora, vale lembrar que passos dados dentro de casa e em pequenos deslocamentos também são contabilizados.
Os cientistas americanos acompanharam por cerca de 10 anos um grupo de 2.110 adultos, com idades entre 38 e 50 anos, sendo 57,1% de mulheres e 42,1% de negros. Os voluntários foram divididos em três perfis: os que davam menos de 7 mil passos por dia; os que andavam de 7 mil a 9.999 passos; e aqueles davam mais de 10 mil passos.
O objetivo do trabalho era observar a associação do ritmo diário com a mortalidade prematura, quando o óbito acontece antes dos 65 anos.
Os pesquisadores descobriram que, independentemente do gênero ou etnia, pessoas que davam pelo menos 7 mil passos diariamente tinham de 50% a 70% menos risco de morrer prematuramente do que aqueles que não alcançaram esta marca.
A atividade física regular é elemento fundamental para manter uma boa saúde. Ela reduz a incidência das doenças cardiovasculares, diabetes, auxilia no controle da pressão arterial e níveis de colesterol. Previne e contribui para tratamento de vários tipos de câncer, osteoporose, problemas digestivos, redução do nível de estresse e aumento do sono, com isso melhorando a qualidade de vida — afirma o cardiologista Bruno Bandeira, coordenador da Cardiologia do Hospital Caxias D’Or.
E não precisa ser muito. Os pesquisadores perceberam que ultrapassar 10 mil passos diariamente não apresentou uma redução adicional de risco de mortalidade em comparação com quem percorreu os 7 mil passos.
O trabalho não levou em consideração a intensidade da caminhada feita pelos voluntários durante o dia. Apesar de outros estudos mostrarem que quanto mais intensa é a atividade — desde que respeite o limite do corpo — melhor a ação na saúde cardiovascular, a pesquisa mostrou que a regularidade no exercício é essencial.
Este trabalho traz uma importante mensagem para as pessoas que não conseguem correr ou andar tão rápido, ou fazer uma outra atividade física mais estruturada (como ir à academia ou fazer um esporte). Mesmo pequenas atividades durante o dia reduzem o risco de mortalidade e de desenvolvimento de doenças cardiovasculares — comenta o cardiologista Daniel Setta, presidente do Departamento de Doença Coronária da Sociedade de Cardiologia do Estado do Rio de Janeiro (Socerj).
A Organização Mundial da Saúde (OMS) orienta que sejam praticados 150 minutos semanais de atividade física moderada, o que dá cerca de meia hora de exercício, cinco vezes por semana.
Para aumentar o nível de passos dados diariamente, os especialistas recomendam incluir pequenas alterações no dia a dia, por exemplo, passar a fazer mais atividades a pé, como ir à padaria ou mercado próximo, e usar a escada no lugar de elevadores. Nos últimos anos uma profusão de aparelhos portáteis têm sido cada vez mais usados no dia a dia com esse objetivo, o de contabilizar os passos diários, até mesmo nas atividades mais domésticas. Os modelos vão de aplicativos para celular a smartwatches e pulseiras inteligentes. Os mais sofisticados registram batimentos cardíacos e queima calórica.
A corrida
Um dos primeiros grandes estudos a valorizar os efeitos das caminhadas é de 2015. Conduzido pelo Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, detalhou o papel dos passos leves na saúde. Grande parte dos benefícios são iguais, tanto na corrida quando no caminhar. Ambos diminuem a taxa de colesterol, assim como reduzem o risco de diabete, hipertensão e infarto. Caminhar, porém, parece ser a melhor para a saúde dos ossos. Esse tipo de atividade estimula a reciclagem adequada dos ossos, com a vantagem de causar menos fraturas por estresse do que a corrida. A caminhada também aperfeiçoa a função das células de defesa diante dos micróbios nocivos.
Mas talvez uma das maiores qualidades dos passos mais lentos seja o fato de se tratar de uma atividade simples de ser incorporada no dia a dia e adaptável para todas a as idades. Para os idosos, em especial, essas são características vitais. Homens e mulheres com idade acima dos 80 anos que adotam o hábito de andar presentam mais massa cinzenta no cérebro do que aqueles que levam uma vida sedentária. Maiores quantidades dessa massa cinzenta significam menor risco de distúrbios de memória, por exemplo. Ou seja, esse tipo de exercício físico ajuda a proteger contra o Alzheimer e outros tipos de demência.
O ambiente influencia
Um estudo feito por pesquisadores da Universidade de Bristol, no Reino Unido, sugere que caminhar em um ambiente confortável oferece os mesmos benefícios que praticar esta atividade cercada de natureza.
Os cientistas já haviam demonstrado anteriormente que caminhar por ambientes cercados de verde melhorava a capacidade de atenção, concentração e bem-estar, o que se traduzia em passos mais rápidos e constantes. Neste estudo, eles descobriram que aqueles que caminhavam olhando para um ambiente no qual não se sentiam confortáveis apresentam um padrão de passo mais lento e variável, ao contrário de daqueles que andavam olhando para cenários que gostavam ou se sentiam confortáveis.
No estudo, os pesquisadores sugerem que ambientes bem projetados para oferecer conforto durante a prática de alguma atividade física podem ser tão benéficos quanto parques com muito verde.
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