segunda-feira, 16 de junho de 2014

Greve paralisa principais festivais de verão da França


O Globo

A luta dos profissionais temporários da indústria cultural francesa — chamados de intermitentes, categoria que engloba 220 mil atores, músicos, técnicos, coreógrafos e outros trabalhadores de eventos ao vivo — contra a reforma da proteção de desemprego, assinada em 22 de março por três sindicatos e três organizações de empregadores, causou graves prejuízos nos primeiros festivais de verão da França, e ameaça cancelar o de maior prestígio, o de Avignon.

O diretor do festival, Olivier Py, advertiu que será obrigado a suspender o evento caso o governo não atenda às demandas dos trabalhadores, que exigem a reprovação do acordo de março pelo Executivo, considerado prejudicial aos intermitentes.

Os trabalhadores temporários, que decretaram greve nacional nesta segunda-feira, se manifestaram nus na última terça-feira, em Guise, na presença da ministra da cultura, Aurélie Filippetti. A estratégia era conturbar os festivais de Aix-en-Provence e de Marselha como provocação para o de Avignon, que começa no dia 4 de julho.

A mobilização afeta todo o país. Em Paris, o Teatro Odeón fechou as portas, e o ciclo de flamenco de La Villette perdeu duas das três noites de programação, incluindo um show do músico catalão Miguel Poveda. Em Tolouse, o Festival Rio Loco foi suspenso, e a Primavera dos Comediantes de Montpellier retirou diversos espetáculos de sua programação. A atriz e cantora Jane Birkin cancelou sua apresentação com Michel Piccoli na aguardada homenagem a Serge Gainsbourg, que estava prevista para o dia 22 deste mês.

Na manhã desta segunda-feira, o primeiro-ministro Manuel Valls pediu que uma “solução imediata” seja encontrada para a greve geral, em declaração para o “France Info”.

O grupo dos “intermitentes do espetáculo”, como são conhecidos na França, foi criado em 1992 e beneficia cerca de 112 mil trabalhadores dos 200 mil que atuam no setor. Os temporários devem trabalhar 507 horas por ano (72 jornadas de sete horas) para cobrir os benefícios sociais — como o seguro desemprego —, que variam entre 500 e 4 mil euros.

A reforma global do sistema de desemprego, que deve ser aprovada ou modificada pelo governo antes do fim deste mês, reduzirá em 10% os benefícios dos trabalhadores temporários do ramo do espetáculo, e deixará sem proteção alguma cerca de 10% dos beneficiários, afirma o sindicato da categoria (CGT-Espetáculos), que não assinou o acordo de março.

Na última sexta-feira, o CGT enviou uma carta aberta ao presidente francês, François Hollande, ameaçando “perturbar todos os festivais de verão”, uma indústria muito importante para um país que recebe da cultura 3,5% do PIB.

O problema para o governo, que enfrenta ao mesmo tempo uma dura greve dos ferroviários franceses, a SNCF, é que o mundo dos espetáculos tem a simpatia dos eleitores de esquerda. Em seus primeiros meses no poder, quando ainda gozava de popularidade, Hollande visitou o Festival de Avignon para celebrar sua vitória com os artistas. Dois anos depois, o evento pode não acontecer: os intermitentes já conseguiram cancelar uma edição do festival, em 2003, quando o governo conservador tentou alterar o plano de seguro-desemprego.

Na quarta-feira passada, os trabalhadores temporários do Festival In anunciaram que, caso o governo aprove a reforma, entrarão em greve geral no dia 4 de julho. Seus colegas do Festival Off, no entanto, apesar do apoio aos companheiros, preferem não forçar uma suspensão das atividades da categoria. Isso poderia causar, segundo eles, um grande prejuízo econômico para a cidade, que gera 31 milhões de euros com os dois festivais.

O diretor do festival, Olivier Py, e a prefeita de Avignon, Cécile Helle, se comprometeram com os grevistas que conversarão com Manuel Valls, primeiro-ministro, para que ele não apoie a reforma. Valls nomeou um mediador para tentar frear o conflito, mas ele se declarou favorável ao acordo. A intenção dos empregadores é acabar com o regime especial dos trabalhadores da categoria.

Em entrevista para o “Le Monde”, a ministra da cultura, Aurélie Filippetti, defendeu a causa dos grevistas: “Os intermitentes não são privilegiados. O regime específico é uma compensação à descontinuidade de seus empregos. Eles mesmos elaboraram contra-propostas que não foram examinadas. Logo, as condições de diálogo não foram satisfatórias.”

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