Para o defensor público Gustavo Pinheiro, o levantamento é um alerta para a situação de crise financeira
KETLEN GOMES
A Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul publicou um levantamento feito entre março de 2021 e março de 2022, que aponta 32 furtos de alimento em Campo Grande. O levantamento foi feito pelo Núcleo Criminal (Nucrim), coordenado pelo defensor público Gustavo Henrique Pinheiro Silva.
No período, foram realizadas 3 mil audiências de custódia no Fórum da capital, destas, 580 foram decorrentes de prisões por furto. A maioria desses crimes envolvem objetos caros, como carros ou celulares, mas 32 são relacionados a alimentos.
O defensor acredita que os números podem ser indicativos da crise financeira. “Embora não seja possível afirmar que houve uma elevação do número de ocorrências relativas a furtos de alimentos em relação aos anos anteriores, em especial porque as estatísticas compreendem o período de 2021 e 2022, já durante as consequências econômicas decorrentes da pandemia, os números levantados chamam a atenção”, destaca Gustavo.
O defensor ainda informa que esse número pode ser ainda maior, já que alguns casos são resolvidos no estabelecimento comercial, quando a equipe de segurança do local “obriga” o pagamento dos produtos.
Dos 32 casos, 27 foram custodiados e tiveram a liberdade provisória concedida já na audiência de custódia, os demais casos tiveram a prisão preventiva decretada, mas foram liberados pouco tempo depois.
Dentre os casos, apenas quatro pessoas estavam empregadas, os demais se dividem em pessoas desempregadas e em situação de rua.
Alimentos
Entre os alimentos que mais foram objetos de furto, a carne, em especial a bovina está em 20 dos 32 casos.
“Na maioria dos casos analisados, as carnes sequer eram tidas como cortes mais ‘nobres’, ou seja, em algumas ocorrências envolviam ‘pescoço de frango’, ‘coração bovino’, ‘charque’, ‘coxão duro’, entre outros”, exemplificou o coordenador da pesquisa.
Casos
Um dos casos analisados foi o de “Maria” (nome fictício), uma mulher de cerda de 30 anos, sem antecedentes criminais, detida em abril de 2021, por furtar duas peças de carne suína e uma porção de muçarela.
Os alimentos eram avaliados em aproximadamente R$ 200. “Maria” disse que já tinha trabalhado como empregada doméstica, e após ficar desempregada, tentou sobreviver da venda de salgados. O desemprego já durava oito meses, e a mulher tinha quatro filhos.
O caso de “Joana” (nome fictício), mostra que o caso de “Maria” não é isolado. A mulher de 30 anos, foi presa em maio de 2021 após furtar 2kg de alcatra, um pacote de pescoço de frango, 100 gramas de salame, 1kg de mandioca, 1 coentro e 2 leites achocolatados.
“Joana” é mãe de uma criança de cinco meses, e relatou que cometeu o crime para sua própria sobrevivência.
Além das mulheres, homens também foram flagrados furtando alimentos. “José” (nome fictício), de 57 anos, pai de uma adolescente de 15 anos, cuidava da jovem sozinho e estava desempregado há dois anos, quando furtou três quilos de carne, avaliados em R$130.
Segundo o homem, ele não tinha o que comer em casa. Ele também foi solto na audiência de custódia e o Ministério Público pediu o arquivamento do inquérito.
Fome
O Brasil retornou ao Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas para Alimentação da Agricultura (FAO) em 2018, após ter saído do índice em 2014. Já em 2020, registrou 55,2% da população vivendo em insegurança alimentar, segundo pesquisa da Rede Penssan.
A Organização das Nações Unidas (ONU) divide em quadros a insegurança alimentar, a capacidade normal de manter-se alimentado. No Brasil, 25% das pessoas vivem em insuficiência alimentar grave e moderada, ou seja, apresentam um quadro de fome.
A insegurança alimentar leve é a incerteza quanto à capacidade de manter o padrão alimentar. Na insegurança moderada, há a incerteza quanto à capacidade de manter o padrão alimentar, com quantidade e frequência reduzidas. Por fim, na insegurança alimentar grave não são consumidos alimentos em um dia inteiro ou mais.
Com informação do Portal Correio do Estado
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