terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Obra do cineastra Jorgem leth reúne mais de 40 titulos

Folha de S.Paulo

Jorgen Leth é um dos gran­des nomes de uma certa linha­gem rica, exuberante e seminal do cinema dinamarquês --um grupo rebelde e anti­conformista que tem entre seus pioneiros Carl Theodor Dreyer (1889-1968), mestre expressio­nista, e entre seus representan­tes mais recentes o pupilo (de ambos) Lars von Trier, funda­dor do movimento Dogma.

A obra de Leth, que reúne mais de 40 títulos, é basica­mente restrita a circuitos de ci­nema de arte, mas alguns cur­tas como "The Perfect Human" (67) estão disponíveis em sites como o YouTube. É um cinema pessoal, tributário das vanguardas, de cunho etnográfico e ligeira­mente inspirado no "cinéma vérité", de Dziga Vertov. Mas seria injusto rotulá-lo de "expe­rimental", como ocorre com frequência. Trata-se de álbuns de registros de um viajante bem-humorado e que evita o hermetismo.

Vários filmes já foram exibi­dos no Festival Internacional de Documentários É Tudo Ver­dade, que patrocinou mais de uma retrospectiva do cineasta. Depoimentos colhidos na últi­ma visita, em 2008, integram o documentário "27 Cenas sobre Jorgen Leth", de Amir Labaki, diretor do festival, que faz uma análise praticamente completa da sua filmografia, além de bas­tante reveladora de seu pensa­mento. O filme será exibido em circuito comercial em março.

Entre os filmes abordados está "Os Cinco Obstáculos" (2003), codirigido por Leth e Von Trier, que traz um jogo de criação entre os dois cineastas inspirado justamente em "The Perfect Man". Também é exibi­da a sequência em que Andy Wahrol, em plano único e câ­mera parada, come um ham­burguer durante alguns minu­tos --uma homenagem à pro­dução da "Factory", do artista pop, e de Paul Morrissey.

O documentário também apresenta inspirações de Leth, como o músico John Cage, os pintores Edward Hopper e Ro­bert Frank (em "66 Scenes from America", 82) e, em um de seus principais momentos, o pintor surrealista Magritte, re­tratado em uma sequência elo­giada pelo dinamarquês.

Também nesse documentá­rio é explorada a ligação de Leth com o Haiti, que começou na década de 80, quando rodou por encomenda seu primeiro longa de ficção, "Haiti Express" (83). Leth ficou tão fascinado que se mudou para o país em 1991. Lá dirigiu "Haiti. Unti­tled" (96), um mapeamento do caos social que tem como pano de fundo a violência, a religião e a sensualidade das mulheres, e "Dreamers" (2002), que com­ põe um painel dos artistas plás­ticos e da arte "naïf" local.

O terremoto quase colocou em risco "The Erotic Human", seu próximo filme, que teve ce­nas filmadas também no Brasil, em 2002 ("com uma modelo no bonde de Santa Teresa e em um hotel barato, no Rio", Leth afir­ma) e em 2008 ("com atrizes em São Paulo, Belém e final­ mente no Rio").

O projeto do filme, assim com suas memórias já lançadas na Dinamarca, geraram rea­ções de feministas no seu país à orma como aborda a sexuali­dade e como retrata as mulhe­res, especialmente as haitianas --"são as mulheres mais boni­tas do mundo", já declarou vá­rias vezes, citando "Os Farsan­tes", romance de Graham Greene ambientado no Haiti e tam­bém fonte recorrente de inspi­ração. Mas Leth rejeita as críti­cas, acostumado a nadar contra a corrente.

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