Eduardo Rodrigues e Priscila Mengue
Estadão
Após reunião entre os secretários estaduais de Saúde na manhã desta sexta-feira, o Conselho Nacional de Secretarias de Saúde (Conass) divulgou na manhã desta sexta-feira, 24, uma "carta de Natal às crianças do Brasil". No texto, o grupo confirma que nenhum Estado exigirá prescrição médica para a vacinação de crianças contra a covid-19.
Na quinta-feira, 23, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou que o governo vai vacinar as crianças apenas mediante prescrição médica e a assinatura de um termo de consentimento pelos pais e responsáveis. A aplicação do imunizante da Pfizer em crianças de 5 a 11 anos foi autorizada há mais de uma semana pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas ainda não tem data de início prevista.
O Ministério da Saúde também abriu consulta pública sobre a exigência de prescrição médica e a obrigatoriedade da imunização. A iniciativa foi criada em um formulário fora de plataformas do governo federal, que apresentou instabilidade ao longo desta sexta, com perguntas dúbias e sem validação de dados, como CPF.
Embora as estatísticas da própria pasta mostrem que uma criança nessa faixa etária morreu a cada 2 dias por covid-19 desde o início da pandemia, Queiroga chegou a dizer nesta semana que não há "emergência" para vaciná-las. Não há data definida para o início da vacinação. Em nota ao Estadão, a Pfizer afirmou estar "atuando junto ao governo para definir as etapas do fornecimento das vacinas contra a covid-19 para imunização da faixa etária de 5 a 11 anos, com estimativa de entregas a partir de janeiro de 2022".
A carta é assinada pelo presidente do conselho e secretário de Saúde do Maranhão, Carlos Lula. "Os cientistas do mundo inteiro apontam a segurança e eficácia da vacina para crianças! Ela inclusive já começou a ser aplicada em meninos e meninas de vários países do mundo. Infelizmente há quem ache natural perder a vida de vocês, pequeninos, para o coronavírus", diz um trecho.
"No lugar de dificultar, a gente procura facilitar a vacinação de todos os brasileirinhos. E é esse recado que queremos dar no dia de hoje, véspera de Natal: quando iniciarmos a vacinação de nossas crianças, avisem aos papais e às mamães: não será necessário nenhum documento de médico recomendando que tomem a vacina. A ciência vencerá. A fraternidade vencerá. A medicina vencerá e vocês estarão protegidos."
O governador do Ceará, Camilo Santana (PT), reafirmou em rede social que o Estado irá vacinar respeitar "o trabalho sério da Anvisa e a posição responsável do Conass(Conselho Nacional de Secretários de Saúde)". "Jamais seguiremos os negacionistas, independente do cargo que ocupam. Esses estão mais preocupados em promover disputas ideológicas e políticas que salvar vidas", afirmou.
Também em rede social, o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD) postou: "Aqui não vai precisar de atestado para vacinar crianças não". Ele, ainda, incluiu a imagem de um trecho do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que destaca a obrigatoriedade da vacinação de crianças "nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias"
Em nota enviada ao Estadão/Broadcast nesta sexta, a Anvisa enfatizou ainda que a autorização para o uso da vacina infantil no Brasil não significa que os pais são obrigados a vacinarem seus filhos. "A concessão dessa autorização favorece o direito ao acesso, em especial, dos pais que tanto desejam a imunização dos seus filhos com uma vacina aprovada pela autoridade sanitária do Brasil e de diversos países", apontou.
"A covid-19 ainda é uma ameaça para as pessoas que não foram vacinadas, isso inclui as crianças. Crianças e adultos podem contrair a covid-19, ficando gravemente doentes, o que pode resultar em hospitalização, e ainda em sequelas e danos à saúde que podem persistir por várias semanas ou mais após a infecção", destacou.
Em evento nesta sexta, o presidente Jair Bolsonaro voltou a defender a necessidade de receita de um profissional de saúde. "No sou médico, tenho uma filha de 11 anos, tem um médico do meu lado aqui. Qualquer procedimento tem que passar pelas mãos do médico", disse ele, ao ao ser questionado sobre o assunto.
Ex-presidente da Anvisa diz que exigência de prescrição 'não tem cabimento' e é inviável
Professor na USP e ex-presidente da Anvisa, o médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto avalia que a exigência de prescrição médica é inviável. “Não temos médicos suficientes para fazer tanta receita. A vacina faz parte do PNI (Programa Nacional de Imunizações). Eu sinto que estão propondo uma proposta de escape. Não tem cabimento.”
Ele também critica a consulta pública criada pelo ministério, a qual apresentou instabilidade por estar em um formulário fora das plataformas do governo. “Não faz nenhum sentido. Não tem cabimento ter nessa altura do campeonato. Uma consulta pública deve ser feita para um assunto com muita controvérsia. A única controvérsia nesse assunto é a opinião do presidente e de negacionista.”
O médico ressalta que a vacinação foi avaliada pela Anvisa e pela Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização da Covid-19 (CTAI). “A comissão (CTAI) foi composta pelo próprio ministro, e agora está sendo desrespeitada por ele”, afirma.
Bolsonaro: não há morte de criança que justifique vacina emergencial
Ainda nesta sexta, Bolsonaro também afirmou que o número de mortes de crianças por covid-19 no Brasil não justifica uma vacinação emergencial. "Não está havendo morte de criança que justifique algo emergencial", disse em entrevista a jornalistas no Palácio da Alvorada.
"Uma pergunta: está morrendo criança de 5 a 11 anos que justifique algo emergencial? Está vendo como é duro discutir? É pai que decide, em primeiro lugar. Eu não quero determinar nada para a saúde", completou o presidente.
O posicionamento de Bolsonaro confere com as declarações de Queiroga sobre a vacinação infantil, embora as estatísticas da própria pasta mostrem que uma criança nessa faixa etária morreu a cada 2 dias por covid-19 desde o início da pandemia. Conforme o Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, ao menos 1.148 crianças de 0 a 9 anos morreram de covid no Brasil desde o início da crise. O número supera o total de mortes infantis por doenças com vacinas existentes. / COLABOROU DANIEL WETERMAN
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