Ao Ministério Público do Trabalho (MPT) por nove empresas produtoras de maçã no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina revelou que 7.668 indígenas de Mato Grosso do Sul foram contratados regularmente para o cultivo, colheita e raleio da fruta em 2021.
É o maior número de trabalhadores descolados à região Sul do país para essa finalidade, desde o início dos recrutamentos em 2011. A maioria sai de aldeias localizadas no município de Dourados com anotação do contrato em carteira e recebe salário mensal de R$ 1,3 mil mais o ganho pela produtividade.
“Somos bem tratados, bem recebidos pelo patrão e por todos. A gente enxerga que somos recebidos de bom coração e é um trabalho que nós sempre mostramos que temos capacidade, a cada empresa que vem”, conta o indígena Paulinho Barbosa, 37 anos e que há três deixa a aldeia Limão Verde, em Dourados, para laborar nas plantações da empresa Bortolon Agro Comercial, instalada no município de Vacaria, Rio Grande do Sul. Neste ano, a Bortolon empregou 1.057 indígenas do estado.
O procurador do Trabalho Jeferson Pereira monitora essas contratações desde 2014, por meio de uma parceria entre MPT, Governo de Mato Grosso do Sul/Funtrab, Instituto de Direitos Humanos, Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo (Coetrae) e Coletivo dos Trabalhadores Indígenas. “Nossa intermediação tem evitado o aliciamento de indígenas e assegurado a preservação dos direitos trabalhistas, bem como a transparência das relações laborais", afirmou.
Ele lembra, ainda, que a abertura desse mercado de trabalho para os indígenas surgiu em um período que muitos perderam oportunidades antes desempenhadas nas lavouras de cana-de-açúcar, após a mecanização da cultura. "Em regra, eles não têm qualificação para trabalhar com máquinas computadorizadas, e a colheita da maçã é manual, faz parte do estilo de vida deles", acrescenta.
O presidente do Coletivo de Trabalhadores Indígenas de Mato Grosso do Sul, José Carlos Pacheco, realça a mudança positiva que o emprego digno da maçã promove na vida desses trabalhadores, além de aquecer a economia dos municípios de origem quando os indígenas retornam para Mato Grosso do Sul, ao final da safra. Segundo ele, o estado arrecada a cada ano em média R$ 28 milhões, beneficiando comércios locais como de Amambai, Coronel Sapucaia, Japorã, Iguatemi, Aquidauana, Anastácio, Miranda e Caarapó.
“Os indígenas começaram a ter visibilidade pela qualidade de vida que essas empresas estão proporcionando a eles. Caminhando pelas aldeias do estado, percebo a diferença que essas oportunidades estão trazendo. Certa vez, fui a uma aldeia no município de Coronel Sapucaia, quando um trabalhador indígena me disse assim: ‘Zé Carlos, venha aqui, está vendo essa casa? Estou construindo com o dinheiro que eu ganhei da maçã’”, lembra emocionado.
As empresas contratantes pagam o mesmo salário-base (em torno de R$ 1,3 mil), mas o rendimento bruto pode variar de acordo com outras vantagens oferecidas, como gratificação por produtividade, podendo chegar a quase R$ 3 mil. Os empregadores também arcam com o custo do transporte dos indígenas (ida e retorno), alimentação, alojamento e cesta básica.
Safra 2022
Em outubro, como atividade de planejamento para a safra 2022, aconteceu no município de Vacaria uma audiência administrativa presencial com a participação de produtores rurais e representantes de diversas empresas do setor de maçã. O encontro colocou no centro do debate o atual cenário das contratações de indígenas e a continuidade da aplicação dos planos de biossegurança elaborados pelos empregadores e dos protocolos sanitários estipulados pelas autoridades de saúde pública com foco na prevenção ao contágio por Covid-19.
Embora exista um caminho que deveria ser observado na relação entre empregador e empregado, nem sempre a legislação é respeitada. Em fevereiro deste ano, a Coetrae-MS constatou indígenas em Vacaria aliciados de maneira precária e clandestina, sendo oferecidos como diaristas e sem vínculo formal para vários produtores rurais. Já na safra anterior, em torno de 300 indígenas foram contratados de forma irregular por empreiteiros conhecidos como “gatos”.
“Por isso, viemos aqui dialogar para que o setor nos ajude a combater essa prática que também configura crime previsto no artigo 207 do Código Penal”, alertou à época da audiência o procurador do Ministério Público do Trabalho. Estimativa da Associação Brasileira dos Produtores de Maçã (ABPM) aponta que em torno de 10% de safristas sejam indígenas.
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