quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Eduardo Leite acumula recuos, alimenta adversários e preocupa aliados no PSDB

 FOLHAPRESS) -


A série de recuos do governador Eduardo Leite (RS) na reta final das prévias presidenciais do PSDB serviu de munição para seus adversários no processo, o governador João Doria (SP) e o ex-prefeito Arthur Virgílio (AM), e preocupou aliados, que buscaram reorientar o discurso do gaúcho.


A divisão fratricida no PSDB só se ampliou desde domingo (21), quando uma pane no aplicativo de votação das prévias impediu a conclusão do pleito -acirrado entre Doria e Leite. Desde então, os governadores voltaram a trocar acusações e discordaram sobre quando a votação deveria ser retomada.



Diante de movimentos erráticos da campanha gaúcha, Doria e Virgílio passaram a atribuir as contradições de Leite a uma influência do deputado federal Aécio Neves (MG) sobre o governador com o objetivo de melar as prévias.


"Não é a minha intenção fulminar esse processo. A gente quer, pelo contrário, que ele se consolide. A gente não quer mais adiamento, postergação", disse Leite à imprensa nesta terça-feira (23), lembrando que ele propôs retomar a votação em 48 horas, enquanto Doria e Virgílio defenderam a votação no próximo domingo (28).


Leite disse ainda que outras candidaturas tentam impor a narrativa de que ele não quer as prévias e pretende adiá-las. "Infelizmente parte da mídia acaba embarcando. O que a gente quer é o quanto antes, tem que encerrar esse processo de votação. Confio que a gente vai ganhar."


O posicionamento vaivém de Leite ficou mais evidente na noite de segunda-feira (22).


Após uma série de reuniões com empresas de tecnologia e com representantes das campanhas na sede do PSDB, o presidente da sigla, Bruno Araújo, anunciou, em nota, que as prévias seriam concluídas até o próximo domingo (28) e que a decisão tinha o aval dos três concorrentes.


Para isso, o partido cobrava a garantia da desenvolvedora do aplicativo, a Faurgs (Fundação de Apoio à Universidade Federal do Rio Grande do Sul), de que a ferramenta estaria solucionada ou procuraria outro aplicativo -que foi o que ocorreu nesta terça, com a contratação da empresa RelataSoft.


Até agora, a Faurgs não diagnosticou os problemas do seu app ou estabeleceu prazo para consertá-lo.


Logo após o anúncio, porém, Leite afirmou não ter dado condição para qualquer tipo de acordo no sentido de trocar o aplicativo.


"A avaliação dessa ferramenta [privada] leva tempo. Estamos diante de uma situação totalmente nova no meio de um processo. [...] Não só não se vai concluir até amanhã [terça] como se está querendo trocar a empresa e o modelo de votação por um outro sistema", criticou.


Araújo rebateu Leite e afirmou que o governador estava ciente da possibilidade de substituir o aplicativo. Doria e Virgílio, por outro lado, elogiaram o anúncio do PSDB e concordaram com a troca do app.


Num cenário em que Doria e Virgílio se uniram, isolando Leite, e passaram a acusá-lo de querer adiar as prévias para melar o processo de vez, a declaração do gaúcho foi considerada um erro mesmo por aliados.


Dirigentes do partido viram imaturidade de Leite e diagnosticaram que ele se desgastou com apoiadores próximos com essa atitude. Já coordenadores da campanha do gaúcho minimizam o episódio, veem Leite favorito e afirmam que Doria estabeleceu uma guerra de narrativas.


Ainda nesta terça, o governador reorientou suas falas. Afirmou que o novo aplicativo proposto terá sua segurança avaliada e deu um voto de confiança na resolução das prévias por essa ferramenta.


Em um vídeo gravado para a militância, voltou a evocar seus tradicionais argumentos contra Doria dizendo representar melhor o PSDB raiz e ser mais viável eleitoralmente por ter menos rejeição. Também explorou a fama de autoritário do paulista, repetindo que o PSDB não deve ter um dono.


"Nós sempre quisemos essas prévias porque não podemos entregar o PSDB a quem não é PSDB. Pra quem só sabe conjugar no 'eu' e não sabe que o partido se conjuga no 'nós'. [...] A gente viu uma série de problemas nesse processo. Muitas denúncias, falta de respostas, dúvidas que ainda existem. Apesar disso tudo, vamos votar e vamos ganhar", disse.


Galeria Prévias do PSDB à Presidência Tucanos disputam votos de correligionários para disputar eleições em 2022 https://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/1714782331620565-previas-do-psdb-a-presidencia *** No domingo, após a suspensão das prévias e durante reunião no partido entre as campanhas para deliberar alternativas, aliados de Leite teriam defendido o adiamento para 2022, segundo afirma Virgílio.


O governador nega e sustenta que sua proposta foi retomar a votação na terça -no fim, a questão técnica não foi resolvida nesse prazo. Aliados de Leite afirmam que, se o adiamento foi sugerido, foi sem o aval do gaúcho.


É a segunda vez que algo assim acontece. Durante uma reunião antes das prévias, no último dia 15, aliados de Leite defenderam adiamento da votação diante da insegurança no aplicativo.


A campanha gaúcha alegou que a fala não representava Leite e até negou que ela tivesse existido, mas o encontro foi gravado.


Doria, que é visto em parte do partido como alguém inábil politicamente, que também acumula tropeços na articulação política, passou a explorar a sequência de erros políticos do rival.


"É preciso ter uma única palavra e uma única atitude. Não é razoável ter uma atitude, 10 minutos depois outra, 15 minutos depois outra", disse Doria sobre Leite no domingo. "Não há razão para adiar as prévias do PSDB exceto por aqueles que querem melar as prévias do PSDB", afirmou ainda.


Doria e Virgílio sustentam que Aécio, rival do paulista, age para boicotar as prévias pois não quer que o PSDB tenha um presidenciável e, para isso, usa Leite. Aliados rebatem que o gaúcho jamais se prestaria a esse papel e descartam influência de Aécio.


Auxiliares de Doria dizem ainda que Leite sabe que perderá as prévias e, por isso, se comporta com desespero. Ao Painel, da Folha, Virgílio afirmou que o governador gaúcho é uma pessoa mimada. "Ele é escorregadio, está mal aconselhado", disse.


Nesta terça, Leite buscou explicar sua posição ao contrariar o anúncio do partido na segunda.


"O que eu contestei foi no sentido que a nota do partido apontava um entendimento que ainda estava em curso, não havia acordo firmado ali. E nem há ainda a consolidação da empresa que vai atender o partido", afirmou, lembrando que o app alternativo ainda está em testes.


Acusado de ser linha auxiliar de Aécio, Leite atribuiu esse papel a Virgílio em relação a Doria. "A gente está vendo o [ex] senador Arthur Virgílio, que tem uma biografia que eu respeito, servindo para falar aquilo que o candidato ao lado dele não deseja falar", disse.


Auxiliares do governador gaúcho afirmam que a fala de Leite na noite de segunda foi mal compreendida e que sua preocupação não é adiar as prévias, mas fazê-las o mais rápido possível desde que com segurança na ferramenta usada.


Confiante na vitória, o entorno de Leite diz que a estratégia é se cercar de garantias para evitar que, derrotado, Doria judicialize o resultado.


"Eu sempre primei e questionei sobre a questão da segurança e da confiabilidade dos sistemas justamente para que a nossa vitória depois não seja contestada", afirmou Leite a jornalistas nesta terça.


Para esses aliados, a posição do governador teve razão de ser pois não havia acordo e tampouco conhecimento sobre o app alternativo em questão. Além disso, Leite demandava respostas sobre a pane no aplicativo no domingo.


Como esse discurso, no entanto, soa contrário à realização da votação, Leite passou a dizer que as denúncias serão apuradas depois e não devem se sobrepor à continuidade das prévias. Tucanos que auxiliam Leite acreditam na possibilidade de hackeamento.


"O mais importante de tudo é concluir o processo", disse Leite à imprensa. "E depois vamos discutir o que tiver acontecido de erros e problemas e o quanto eles comprometem o processo ou não", completou.


Outra preocupação da campanha gaúcha é retomar a votação para evitar que eleitores tucanos estejam vulneráveis à abordagem de aliados de Doria. Leite lembra em suas falas à imprensa os episódios de pressão e retaliação aos seus aliados em São Paulo.

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