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Paulo Marcos Esselin, Professor Aposentado da UFMS
Riedel promete proteção, mas Mato Grosso do Sul vê violência contra Mulheres, crianças, adolescentes, as minorias e ações policiais letais crescerem em proporção alarmante
A segurança pública, tema de destaque nas eleições de 2022, transformou-se em uma crise de “insegurança pública” em Mato Grosso do Sul, marcada pelo aumento vertiginoso de crimes violentos, especialmente contra mulheres, crianças, adolescentes e as minorias. Passados quase três anos da posse de Eduardo Riedel, as promessas de campanha na área da segurança, notadamente o compromisso de “acolhimento humanizado e especializado“ para combater a violência de gênero, parecem ter sido esquecidas, configurando o verdadeiro “estelionato eleitoral. O popular e famoso 171.”
A análise dos índices de segurança por 100 mil habitantes, essenciais para uma comparação justa com grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro, este último palco do maior morticínio causado por agentes de segurança, revela três focos de crise em franca escalada sob o governo de Eduardo Riedel: a violência de gênero, desprezo as minorias (incluindo a grade população indígena do MS) e a letalidade policial.
O programa de governo de Riedel prometia alcançar a igualdade de gênero e proteger mulheres, crianças, adolescentes e as minorias. No entanto, a realidade é cruel: as mulheres continuam sendo agredidas, violentadas e assassinadas diariamente, com Mato Grosso do Sul assumindo uma posição de destaque nos índices nacionais de feminicídios. A violência contra as mulheres em MS não é apenas de números absolutos, mas de intensidade. A proporção de feminicídios em relação aos homicídios de mulheres no período de 2015-2024 cresceram 224,20% e apenas nos últimos 4 anos em 69,4% (Anuário 2025). Coincidência ou não, temos nesse período a gestão do estado por representantes do agro.
Em 2022, Campo Grande (Capital do MS) registrou uma taxa alarmante de 80 casos de estupro para cada 100 mil habitantes, uma taxa que expõe o fracasso das políticas de proteção. Esta taxa é, em proporção populacional, historicamente uma das maiores do país (Anuários 2024 e 2025), demonstrando que a mulher sul-mato-grossense está em risco desproporcionalmente maior do que em muitas capitais do Sudeste, com população 10 a 20 vezes superior à de Campo Grande.
O problema é agravado pela violência sexual contra crianças e adolescentes: MS está entre os 5 estados da federação com a maior ocorrência de estupros nessa faixa etária, indicando que a proteção prometida é inexistente para os mais vulneráveis.
Os dados são alarmantes e expõem o fracasso das soluções apresentadas. No ano de 2023 o MS registrou a taxa de 155,8 por cada 100 mil habitantes, em 2024, foram registrados 144,3 por cada 100 mil habitantes de estupro e estupro de vulnerável cujas vítimas foram mulheres, enquanto a média nacional foi de 68,9 e 68,7 por 100 mil habitantes. Os números apenas demonstram o que a população vivencia em nosso estado.
A violência de gênero representada nas taxas alarmantes supracitadas, se repetem nos feminicídios, sendo que, no ano de 2024 foram 35 feminicídios consumados e 87 tentativas. Em 2025, os números seguem em alta com 32 feminicídios e 63 tentativas até o momento (28/10). Estamos entre os 5 estados da federação que mais comete feminicídios ao longo dos últimos anos.
Um caso que escancarou as falhas do sistema foi o brutal assassinato da jornalista Vanessa Ricarte, assassinada após ter seu pedido de proteção negligenciado pela DEAM – Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher, é o epítome do “descaso e das falhas em todo o sistema de combate à violência contra a mulher” – Uma rede que falhou em sua missão mais básica. Fragilizada e sob ameaças, Vanessa buscou proteção na DEAM. A despeito do histórico criminal do agressor, a jornalista foi liberada sem acompanhamento policial, o que foi determinante para que seu agressor a esfaqueasse até a morte.
A própria vítima, em uma ligação a um amigo, denunciou o tratamento inadequado e “frio” que recebeu ao pedir proteção, ilustrando o descaso que atinge as mulheres mais vulneráveis: “Me tratou bem fria, seca, toda hora me cortava” […] “eu que tenho toda a instrução, escolaridade, fui tratada dessa maneira, imagina uma pessoa, uma mulher vulnerável lá”. “Essas que vão para a estatística do feminicídio”. Mal sabia que ela com toda sua instrução e conhecimento hoje compõe a estatística que ora descrevemos.
A repercussão do caso levou o governador Riedel a pedir “punição rigorosa do assassino”, mas a resposta estatal às falhas foi, no mínimo, controversa. Apesar de o próprio governador reconhecer falhas, um relatório da Corregedoria da Polícia Civil concluiu que “todos os protocolos foram seguidos” pelas delegadas que atenderam Vanessa.
Em vez de punição, as delegadas envolvidas foram transferidas para novos postos na Polícia Civil – uma delas para a DGPC, e a outra para uma DEPAC – sendo ainda homenageadas com buquês de flores pelas colegas, o que “evidencia respeito, carinho, paz, pureza, serenidade, alegria e amizade, exatamente tudo o que faltou durante o atendimento a essa vítima e quiçá a outras que constam nesses números alarmantes “. O inquérito segue em sigilo, reforçando a sensação de que a sociedade jamais saberá a verdade.
A crise de segurança vai além da violência de gênero. As estatísticas de letalidade policial (Mortes Decorrentes de Intervenção Policial – MDIP) nos dois governos, Reinaldo e Riedel assustam. O nº de mortes decorrentes de intervenções policiais em 2023 cresceu no Estado de MS 160,8%, o maior crescimento do País. Nos últimos 3 anos são 270 mortes por intervenção letal do Estado (MDIP), o que representa 45,5% das mortes em mesma circunstância na última década – 2015 a 2025 no estado de MS.
Este aumento não surpreende, segundo críticos, ao considerarem que Riedel, enquanto presidente da FAMASUL, organizou o “Leilão da Resistência” no ano de 2013, com o objetivo de arrecadar fundos para armar produtores rurais contra a população indígena do estado, evidenciando uma postura que favorece a violência institucionalizada. De forma muito clara se demonstrou “a cultura de uso excessivo e não pacífico da força.”
O cenário atual é a consolidação de um ciclo de violência herdado, ironicamente, da ditadura militar, que, longe de contê-la, fez crescer os “esquadrões da morte”. A insegurança pública em Mato Grosso do Sul é o resultado da ausência do Estado em serviços essenciais e na proteção das minorias, aliada à ineficiência em ofertar segurança e ao distanciamento das forças policiais da população.
A sociedade sul-mato-grossense vive hoje uma profunda desilusão. Há uma certeza generalizada de que “Mudanças URGENTES são necessárias nos rumos do MS” para que a violência não continue sendo a regra ditada pelo “coronelismo e a elite arcaica que domina o MS”.
*Fontes Principais: Atlas da Violência 2025 (Ref. 2023); Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024 e 2025; SEJUSP-MS; Artigos jornalísticos referindo-se aos anos-base 2022/2023/2024/2025. Os dados de Estupro e Homicídio são os mais consistentes na comparação proporcional.

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