quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

Seca no Sul e chuvas no Sudeste podem aumentar a inflação em 2022, diz economista da FGV

 




Márcia De Chiara- Estadão


Fenômenos climáticos extremos, como a seca no Sul e o excesso de chuvas no Sudeste, e seus impactos sobre os preços da comida podem ser mais um fator de risco para inflação deste ano, alerta o coordenador de índices de preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), André Braz. “À medida que esse fenômeno persistir, o saldo pode ser de preços mais altos para alguns alimentos básicos e isso pode gerar um problema maior para conter o avanço da inflação.”


Para 2022, o economista projeta uma inflação de 5%, sem considerar o risco de uma alta adicional da alimentação por conta do clima. Se a projeção se confirmar, a inflação de 2022 medida pelo IPCA será a metade da registrada no ano passado, de 10,06%, o maior resultado anual desde 2015. Braz frisa que, apesar da desaceleração esperada para este ano, o brasileiro não deve sentir um alívio, já que a alta acumulada nos preços em dois anos será de 15%. “Vamos viver um período de inflação persistente, acima da meta, com juro alto, que vai continuar causando mal estar às famílias.” A seguir, os principais trechos da entrevista.


Como o sr. avalia o resultado da inflação de 2021, que atingiu 10,06%?

Era um resultado esperado por causa das pressões muito concentradas em energia e combustíveis. Praticamente a metade da inflação do ano passado foi influenciada por esses dois preços, que contaminam outros setores, como a indústria e os serviços, por exemplo. Esse espalhamento se materializou. Vimos uma recuperação grande da inflação de serviços e de bens duráveis.


A fatia dos preços que subiram de novembro para dezembro aumentou mais de dez pontos porcentuais, de 63,13% para 74,8%. É um descontrole?

Essa é a prova do espalhamento, mas não é descontrole, porque a taxa em 12 meses até recuou em relação a novembro.


Será um risco se persistir nesse patamar. Mas acho que ela visitou esse novo patamar, porque em dezembro é sempre um mês de demanda mais forte. A difusão não vai ficar aí. Isso porque a inflação que projetamos para janeiro corresponde à metade da inflação de dezembro. Para janeiro espero um aumento de 0,35%. É um mês de volta às aulas, de despesas fortes para as famílias e demanda enfraquecida. Acho que a pressão de janeiro virá em torno dos alimentos. As chuvas estranhas que tem acontecido no Sudeste e a seca no Sul.


Qual a perspectiva da inflação para este ano?

A agricultura, que não estava na conta como fonte de pressão inflacionária tão forte para 2022, agora começa a entrar no radar. Esse calor extremo no Sul pode afetar as lavouras de ciclo mais longo que podem diminuir a contribuição da agricultura para conter a inflação de 2022. À medida que esse fenômeno persistir, o saldo pode ser preços mais altos para alguns alimentos básicos e isso pode gerar um problema maior para conter o avanço da inflação deste ano.


Qual é a sua projeção de inflação para 2022?

Esperamos uma inflação que corresponda à metade da registrada no ano passado, sem contar com uma pressão maior dos alimentos por causa do clima. Essa inflação de 5% é muito distante da meta de 3,5% prevista para este ano.


Quando o brasileiro vai sentir algum alívio na inflação?

A inflação subiu 10% o ano passado e deve subir mais 5% este ano. É um aumento em cima de outro, não tem alívio. É uma inflação acumulada de 15% em dois anos. Alívio mesmo as pessoas só vão sentir quando encontrarem emprego e a renda começar a crescer mais do que a inflação. Isso não vai acontecer porque o próprio instrumento para conter o avanço da inflação é o aumento dos juros que não privilegia o investimento necessário à geração de emprego. Vamos viver um período de inflação persistente, acima da meta, com juro alto, que vai continuar causando mal estar às famílias.


No ano passado, o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), que é a inflação para as famílias de baixa renda subiu 10,16%, um pouco acima do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor) de 10,06%. Neste ano, o cenário complica para a baixa renda com o risco de os alimentos serem afetados pelo clima?

A inflação que a baixa renda enxerga é a inflação dos alimentos. Os mais ricos têm o gasto concentrado em serviços. Para a maioria da população, o que vale é a inflação de alimentos.


A nova onda de covid-19, causada pela variante Ômicron, pode pressionar os preços?

Ela complica porque pode haver a desmobilização de cadeias produtivas , com falta de peças, como já ocorreu na indústria automobilística, por exemplo. Isso contribuiu para aumentos de preços dos carros que subiram no ano passado acima da inflação. Este ano também é de eleição, o que pode pressionar o câmbio. O cenário inflacionário para 2022 está bem conturbado, com muitas variáveis de risco.

Nenhum comentário: