terça-feira, 27 de abril de 2021

Guedes demite secretário da Fazenda após embates em torno do Orçamento

 


Estadão


 Após o desfecho da crise no Orçamento de 2021, o ministro da Economia, Paulo Guedes, está promovendo uma grande reformulação em postos-chaves da sua equipe. As mudanças podem ajudar, admitem fontes ouvidas pela reportagem, a reverter a pressão política pela divisão do Ministério da Economia, que cresceu no rastro do impasse provocado pela aprovação da lei orçamentária com cortes de despesas obrigatórias para acomodar o aumento de emendas parlamentares


Guedes demitiu Waldery Rodrigues do cargo de secretário especial da Fazenda, após embates na sanção do Orçamento. Para seu lugar, o escolhido foi o atual secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, segundo apurou o Estadão/Broadcast. Na hierarquia do Ministério da Economia, o Tesouro Nacional é ligado à Secretaria Especial da Fazenda.


A saída de Waldery do cargo vem depois de uma série de embates em torno da sanção do Orçamento de 2021, que sofreu um veto de R$ 19,8 bilhões em despesas e um bloqueio adicional de R$ 9,3 bilhões.



A área comandada por ele foi uma das mais ferrenhas defensoras do ajuste no Orçamento por conta da maquiagem em despesas obrigatórias, como os benefícios previdenciários, uma visão contrária à do Congresso, de que a peça poderia ser sancionada integralmente.


Segundo relatos feitos à reportagem, Waldery queria ficar no cargo até junho, mas o Orçamento mostrou a necessidade de antecipar uma mudança que já estava no radar. A condução do processo pelo atual secretário foi muito criticada pela ala política, mas o trabalho de Waldery também costuma ser alvo de outras áreas dentro do Ministério da Economia, que reclamam que as decisões importantes "travam" na Fazenda.



O atual secretário especial de Fazenda já esteve na mira do presidente Jair Bolsonaro no ano passado, quando defendeu congelar aposentadorias e mexer no seguro-desemprego para liberar recursos ao Renda Brasil, como era chamada a proposta de reformulação dos programas sociais. Na época, Bolsonaro ameaçou dar "cartão vermelho" a Waldery e já chegou a pedir a cabeça do secretário.


Desde aquela época, o secretário silenciou e evitou polêmicas. Na coletiva sobre o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2022, ele evitou falar sobre o impasse até então sem solução em torno do Orçamento de 2021 - as perguntas sobre o tema foram censuradas pelo Ministério da Economia.


Para o lugar de Funchal no Tesouro, o ministro da Economia, Paulo Guedes, pode buscar um nome dentro da própria pasta. Jeferson Bittencourt, assessor especial de Relações Institucionais e funcionário de carreira, é cotado para assumir o cargo.


Funchal assumiu o Tesouro em julho de 2020, após a saída de Mansueto Almeida. Antes, ele foi diretor de programa na própria Secretaria Especial da Fazenda.


A troca no Tesouro e na Fazenda não é a única dentro do Ministério da Economia. Como mostrou o Estadão ontem, a assessora especial para reforma tributária, Vanessa Canado, vai deixar a equipe de Guedes. A saída deve ocorrer antes da votação do relatório de reforma tributária na Câmara dos Deputados.


O economista Isaías Coelho deve assumir a assessoria especial para a reforma tributária no lugar de Vanessa Canado, que está de saída do Ministério da Economia, segundo apurou o Estadão/Broadcast.


Coelho hoje é professor do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu da Escola de Direito de São Paulo (FGV), pesquisador sênior do Núcleo de Estudos Fiscais (NEF) da FGV Direito SP e consultor internacional em política e administração tributária.


Ele já atuou como professor adjunto da Universidade de Brasília, foi secretário adjunto da Secretaria da Receita Federal e chefe das divisões de administração e política tributária do Fundo Monetário Internacional.


Segundo apurou a reportagem, Coelho já vinha participando dos debates das propostas na área tributária com a equipe do ministro Paulo Guedes.


Secretário de Orçamento também deve deixar o cargo

O secretário de Orçamento Federal (SOF), George Soares, também vai deixar o cargo. Ele é subordinado a Waldery. Os dois tiveram vários atritos nos últimos meses. Na crise do Orçamento, o clima piorou. O secretário de Orçamento sofreu desgaste na discussão do Orçamento e pediu para sair do cargo, segundo apurou o Estadão. Soares segurou até finalizar a votação da alteração na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e o acordo político para os vetos do Orçamento.


Antes mesmo da aprovação do Orçamento com manobras para aumentar as emendas, a cabeça de George já tinha sido pedida por ministros palacianos e lideranças do Centrão, irritados com tantas restrições e regras fiscais apontadas pelo secretário para a adoção de medidas fiscais.


George será substituído por Ariosto Antunes Culau, um quadro técnico de grande experiência na área orçamentária com passagem em vários postos pela Esplanada. Ele trabalhou como secretário-executivo adjunto ao lado de Eduardo Guardia, então secretário-executivo do Ministério da Fazenda de Henrique Meirelles, no governo Michel Temer.


Ariosto é servidor público federal de carreira no cargo de Analista de Planejamento e Orçamento do Ministério da Economia. Exerceu a função de secretário de Orçamento Federal, subsecretário de Assuntos Econômicos e secretário-executivo adjunto do então Ministério da Fazenda. Atuou como secretário de Gestão Corporativa do Ministério da Economia, tendo auxiliado na estruturação do novo Ministério. Até recentemente, atuou como Secretário de Educação Profissional e Tecnológica (Setec) do Ministério da Educação.


Mais saídas dentro da Economia

A secretária especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Martha Seillier, também deve deixar o comando da área os próximos dias. O Estadão/Broadcast apurou que ela deve assumir um cargo no Banco Mundial e que o PPI voltará a ser vinculado ao Palácio do Planalto – hoje, ele está dentro da estrutura do Ministério da Economia.


Martha Seillier é servidora pública federal de carreira, especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental. Formada em direito e economia, ela é braço-direito do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas. Já foi presidente da Infraero, assessora-chefe da Casa Civil e diretora da Secretaria de Aviação Civil. O sucesso do programa de concessões de infraestrutura do governo é atribuído a Martha e Tarcísio – o que despertou incômodo em outras áreas do governo.


Hoje, 27, Martha participa de entrevista coletiva após a reunião do Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (CPPI). Até janeiro de 2020, o PPI era subordinado à Casa Civil, então comandada por Onyx Lorenzoni, hoje ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República. O nome do ex-ministro da Saúde general Eduardo Pazuello chegou a circular entre os candidatos para assumir o PPI no mês passado.


Ainda está de saída a secretária-adjunta de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Yana Dumaresq. Ela deve ser substituída pelo atual subsecretário adjunto de Negociações Internacionais da pasta, João Rossi.


De acordo com fontes, Yana comunicou a equipe que deixaria o governo para seguir para a iniciativa privada, o que deve ocorrer até o fim desta semana. Ela ocupava o cargo de “número dois” do Comércio Exterior desde o início do governo Jair Bolsonaro, em janeiro de 2019 e tinha sido secretária-adjunta do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic) anteriormente.


Seu substituto, Rossi é funcionário de carreira do antigo Mdic e foi diretor de Comércio Exterior do Ministério da Agricultura. Foi responsável pela coordenação da agenda internacional do ministro, pelo acompanhamento de negociações internacionais e coordenação de ações referentes à acessão do Brasil à OCDE. Formado em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB), tem MBA em Negócios Internacionais e Comércio Exterior pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).


Outras baixas na equipe de Guedes

No início do ano, o presidente Jair Bolsonaro pediu a cabeça do presidente do Banco do Brasil, André Brandão, por discordar do plano de enxugamento de agências e corte de pessoal do banco. Também foi demitido o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, por divergências com o presidente sobre a política de preços dos combustíveis e o tratamento aos caminhoneiros, base de apoio do governo.


Além de Castello Branco, Bolsonaro já mandou demitir dois auxiliares de Guedes que bateram de frente com ele. No primeiro ano de mandato, o presidente decidiu demitir o então secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, porque considerou que a discussão sobre a criação de um imposto nos moldes da CPMF se tornou "pública demais". Embora tivesse apoio da equipe econômica, o assunto gerou polêmica e não agradou os seus apoiadores.


Bolsonaro também influenciou na mudança de comando de outro banco público ainda em 2019. Ele disse que o então presidente do BNDES, Joaquim Levy, estava com "a cabeça a prêmio" durante conversa com jornalistas. No dia seguinte, Levy pediu demissão do cargo.


No ano passado, o próprio Guedes reconheceu, em agosto, uma "debandada" em sua equipe. No caso do secretário especial de Desestatização, Salim Mattar, o motivo foi a lentidão das privatizações, estagnadas na pandemia, mas travadas desde antes por pressões políticas.


Já o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Paulo Uebel, preferiu deixar o cargo a permanecer “engavetado” no ministério junto com a proposta de reforma administrativa, que acabou saindo pouco depois.


Guedes também perdeu dois auxiliares que foram “promovidos” justamente por avançarem em suas agendas. O ex-secretário especial de Comércio Exterior, Marcos Troyjo, foi indicado em junho para a presidência do Novo Banco de Desenvolvimento – o “Banco dos Brics”, com sede em Xangai, após o sucesso na conclusão do acordo entre o Mercosul e a União Europeia no ano passado.


Já o ex-secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, colheu os louros da aprovação da reforma da Previdência - o maior feito do atual governo na economia até agora – e foi alçado ao posto de ministro do Desenvolvimento Regional. Agora aliado à ala militar do Planalto, ele tem sido o maior “rival” de Guedes no embate sobre a abertura da torneira de gastos do governo no pós-crise. / COLABORARAM ANNE WARTH E LORENNA RODRIGUES

Nenhum comentário: