quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

ESTREIA–“Eu, Daniel Blake” retrata enfrentamento da burocracia por homem comum



 Uma das melhores reflexões sobre o mundo conturbado em que vivemos veio do inglês Ken Loach, com a joia humanista “Eu, Daniel Blake”, que lhe garantiu a segunda Palma de Ouro no Festival de Cannes 2016. Sua primeira Palma havia sido “Ventos da Liberdade” (2006).

Não é uma temática nova a que Loach visita, como o desemprego – como ele fez no magnífico “Meu nome é Joe”. Mais uma vez, o título é uma afirmação de identidade de um homem comum, no caso, o carpinteiro Daniel Blake (Dave Johns).

Aos 59 anos, ele sofreu um AVC e foi posto de licença médica. Meses depois, os médicos não o liberam para voltar ao trabalho, já que ele continua frágil para exercer uma profissão fisicamente exigente. Ao mesmo tempo, um outro setor da burocracia estatal, a que lhe garante o pagamento da pensão, insiste que ele pode voltar e deve também procurar trabalho.

Preso num verdadeiro labirinto kafkiano, Daniel afirma sua sabedoria de homem simples, compondo um dos mais extraordinários heróis populares de que Loach, associado ao seu impecável roteirista, Paul Laverty, foi capaz de produzir.

Mesmo num cotidiano de privações, Daniel encontra tempo e disponibilidade para ajudar seus jovens vizinhos imigrantes e também uma mãe solteira, Katie (Hayley Squires), outra vítima da formidável teia da burocracia britânica, que multiplica obstáculos no caminho de quem requer benefícios sociais.

Por conta dessas barreiras burocráticas, Katie e seus dois filhos estão literalmente passando fome, dependendo dos chamados “bancos de alimentos” – num deles, ambienta-se uma das cenas mais dramáticas do filme.

Felizmente, o premiado cineasta não cumpriu a promessa apressada de aposentadoria, que anunciou após “Jimmy’s Hall” (2014). Aos 80 anos, ele mantém uma lucidez antenada sobre o mundo atual, compondo uma história nada maniqueísta, habitada por pessoas profundamente enraizadas na vida real.

Como declarou recentemente em entrevistas, o roteirista Paul Laverty conta ter pesquisado intensamente as histórias que estão no filme. Segundo ele, nenhuma situação aqui retratada é fruto de sua imaginação.

(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb

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