Por Ingrid Luisa/Superinteressante Foto;(Rebecca Nelson/Getty Images)
Durante uma competição de “bombeiros mirins” na Polônia, a imprensa local notou algo curioso: todas as crianças que representavam a pequena vila polonesa de Miejsce Odrzanskie eram garotas.
As razões para isso poderiam ser várias: as meninas daquela vila se interessam mais pela coisa do que os meninos, as garotas venceram os garotos na seleção final dos participantes, ou, vai saber, houve algum problema com os meninos que participariam e acabaram indo só meninas.
Mas não. Ao investigar o caso, a imprensa descobriu que a verdadeira razão é bem mais surpreendente: faz um década que não nasce nenhum bebê do sexo masculino na vila.
Miejsce Odrzanskie é uma pequena vila agrícola nos campos do sudoeste da Polônia, não muito longe da fronteira tcheca. Como tantas outras aldeias polonesas, ela regristrou um declínio acentuado na população: antes da Segunda Guerra Mundial havia registros de 1.200 moradores, agora existem 272. Especialistas acreditam que a entrada do país na União Europeia, em 2004, contribuiu para esse esvaziamento, pois muitas pessoas emigraram para países com mais oportunidades.
Nos últimos 10 anos, apenas 12 bebês nasceram por lá, e todos eram garotas. O prefeito da comuna de Cisek, que inclui a vila, alegou que a situação está fora de controle, e resolveu até oferecer uma recompensa em dinheiro para a primeira família que tiver um filho homem.
“Houve tanta conversa sobre nós na mídia que, por um minuto, pensei em nomear uma rua para o próximo garoto nascido aqui”, disse o prefeito, Rajmund Frischko, ao The New York Times. “Ele definitivamente receberá um presente muito bonito. Plantaremos um carvalho na vila e daremos o nome dele.”
Ainda de acordo com o prefeito, alguns cientistas demonstraram interesse em estudar geneticamente a população do vilarejo para entender o acontecido. Diante desse caso curioso, e até mesmo da recompensa em dinheiro, fica a pergunta: isso é mesmo fruto da genética?
Menino vs Menina
Na verdade, o sexo de um bebê depende do cromossomo sexual que o espermatozoide carrega. Se ele tiver um cromossomo X, combinado ao cromossomo X da mãe, dará origem a uma menina (XX); se tiver um Y, nascerá um menino (XY). O número de espermatozoides que carregam X e Y é aproximadamente igual, então as chances de nascer um menino ou uma menina são as mesmas: 50% para cada lado.
Mas a prática nem sempre segue a risca a teoria. Segundo pesquisadores da Newcastle University, os homens herdam uma leve tendência a ter mais espermatozoides X ou Y de seus pais – um homem com muitos irmãos tem mais chance de ter filhos homens e um com muitas irmãs tem uma maior probabilidade de ter filhas mulheres. Já um estudo da University of Exeter aponta que a dieta da mãe antes da concepção do bebê também pode influenciar no sexo da futura cria: de acordo com eles, altos níveis de glicose estimulam a chegada de espermatozoides que carregam o Y e prejudicam os que carregam o X.
O caso da vila polonesa, porém, pode muito bem ser só uma coincidência. Craig Anderson, professor de estatística da Universidade de Glasgow, escreveu em um artigo para o The Conversation que aquilo é apenas uma resposta normal da probabilidade: assumindo os nascimentos foram 12 eventos aleatórios consecutivos e que há uma probabilidade de 50% entre os sexos, a chance de nascerem 12 meninas seguidas é de uma em 4.096. Baixa, mas nada impossível – a chance de você ganhar na megasena, afinal, é de uma em 50 milhões.
Parece uma chance mínima. “Se você fosse informado de que havia 1 em 4.000 chances de chover amanhã, provavelmente você não levaria seu guarda-chuva”, brinca o pesquisador no artigo. Mas não. Qualquer sequencia de nascimentos é tão improvável quanto essa. A probabilidade de 12 dos 12 nascimentos serem meninas em Miejsce Odrzanskie é a mesma de qualquer sequencia alternada menino-menina-menino-menina.
De fato. Considere “F” para sexo feminino e “M” para masculino. A sequência exata de nascimentos FFFFFFFFFFFF tem 1/4096 chance de acontecer, mas a chance de nascer exatamente FFMMFMFMMFMM também é 1/4096. “Se isso [a segunda sequencia] tivesse acontecido na última década em Miejsce Odrzanskie, ninguém teria prestado a mínima atenção, porque parece mais ‘normal'”, diz Craig Anderson.
No fim, o caso chama a atenção por conta da escala de tempo envolvida. Miejsce Odrzanskie é uma aldeia muito pequena, com 272 pessoas e uma taxa de natalidade não muito superior a uma criança por ano. Menos que muito condomínio por aí. Nascem 10, 12 meninas consecutivas em qualquer hospital, mas isso é algo que passa despercebido em lugares onde nascem dezenas de bebês por dia.
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