domingo, 12 de janeiro de 2025

Férias frustradas: família perde mais de R$ 20 mil em golpe com contato falso de pousada no Google

 


Estava tudo certo para a viagem de férias do casal Mariana Vianna e Ricardo Sodré com os dois filhos. A família paulistana passaria sete dias em Fernando de Noronha neste mês de janeiro. A reserva numa pousada famosa da paradisíaca ilha no litoral de Pernambuco foi feita depois de a empresária escolher os quartos e checar as opções de lazer. Mas depois de o pagamento ser realizado, os planos foram por água abaixo quando ela descobriu ter sido vítima de um golpe e perdido nada menos que R$ 27 mil.


Mariana buscou pela Pousada Zé Maria no Google, e ligou para o telefone indicado no portal de buscas. Uma suposta atendente deu todas as informações, mostrou imagens das acomodações e enviou um link para o pagamento. Ela clicou e pagou com um cartão de crédito do Bradesco, parcelando em 10 vezes.


Alguns dias depois de pagar a reserva, Mariana tentou contato novamente para checar se o transporte do aeroporto para o hotel tinha cadeirinha para o filho de 2 anos, mas a ligação não completava. Ela estranhou e buscou a pousada pelas redes sociais, onde encontrou um alerta de que criminosos estavam usando o nome da empresa para aplicar golpes.


Um concierge da Zé Maria chegou a comentar com Mariana que o caso dela não foi o primeiro. Outras famílias vítimas dos estelionatários só descobriram o golpe ao desembarcar na ilha e não encontrar a hospedagem reservada.


— Estou desesperada. É uma revolta muito grande — lamenta a executiva.


Tentativa de cancelamento

O crime foi registrado na Polícia Civil de Pernambuco. A empresária tenta agora o cancelamento do pagamento junto ao Bradesco. Inicialmente, o banco pediu uma declaração da pousada sobre a fraude, o que foi feito, mas o pedido segue sob análise desde o dia 22. Em nota, o banco afirmou que por questão de sigilo “o assunto está sendo tratado diretamente com o cliente”.


— Quase que diariamente a gente sofre tentativas de golpe. Cabe aos bancos e outras empresas serem mais flexíveis para entender e ter mais agilidade nas análises quando há um boletim de ocorrência denunciando uma fraude. É isso que o consumidor espera — desabafa Mariana.


Além do valor da reserva, que foi embora e inviabilizou as férias da família, somou-se ao prejuízo o que foi gasto com as passagens aéreas entre São Paulo e Noronha: R$ 7,2 mil. Mas a Latam cancelou os bilhetes e devolveu o dinheiro.


A dor de cabeça enfrentada por Mariana serve de alerta para quem planeja férias com a ajuda da internet. Nessa hora, é preciso redobrar os cuidados. Professor de Direito da FGV-SP, Fernando Eberlin avalia que, já que a pousada esclareceu nas redes sociais e em seu site sobre o uso do nome do estabelecimento em fraude, não houve negligência.


Mas diz que empresas também precisam monitorar a internet e buscadores para manter informações de contato e links atualizados, evitando riscos aos clientes.


— A questão que fica é se a pousada acionou o Google sobre a retirada do número de telefone falso. Quando pensamos nos princípios do Código de Defesa do Consumidor (CDC), como transparência e boa fé objetiva, a pousada deve buscar a plataforma para corrigir isso — diz o advogado.



Canais oficiais

Ele recomenda que, ao comprar passagem ou reservar hospedagem, o consumidor sempre procure canais oficiais e verificados das empresas antes de pagar. Além disso, também é possível buscar plataformas reconhecidas no setor, como Booking.com, e checar avaliações em sites como TripAdvisor. Exigir o contrato do serviço e ler todos os detalhes também é importante, alerta:


— Muita coisa não está clara na legislação, e são as políticas descritas em contrato que nortearão as regras do serviço.


Rafael Viola, professor de Direito do Ibmec, destaca que nada impede que o parcelamento seja suspenso pelo banco. Viola explica que, nesses casos, como não há ligação com a fraude, valem as regras da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac):


— O usuário pode desistir da passagem aérea até 24 horas após a compra. Depois disso, o consumidor pode perder um valor no cancelamento, porque a legislação autoriza que, se o transportador não tiver tempo hábil para renegociar o bilhete, ele pode reter uma parte do preço da passagem.


Ele completa:


— Somando todos esses prejuízos, há ainda a frustração, que dá direito a uma indenização por danos morais contra os golpistas, mas é muito difícil efetivar esse direito pela dificuldade em localizar essas quadrilhas.


A Polícia Civil de Pernambuco informou que a Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos faz diligências para esclarecer o caso.


Mesmo nome

O link de pagamento enviado pelos golpistas a Mariana mostra como destinatária a pessoa jurídica Pousada Zé Maria LTDA, mesmo nome da pousada verdadeira, mas com CNPJ diferente do estabelecimento de Noronha.



O cadastro dos estelionatários é o de uma microempresa, com atividade principal de operador turístico, aberta em meados de novembro em Campina Grande, no estado vizinho da Paraíba. No endereço cadastrado na Receita Federal funciona uma pousada chamada Ariús. A direção do estabelecimento negou relação com o caso e disse ao GLOBO que registraria um boletim de ocorrência.


Advogado da Pousada Zé Maria, Gustavo Ramiro diz que assim que o estabelecimento tomou conhecimento dos golpes, o caso foi registrado na Polícia Civil. Além disso, a empresa buscou o Google para a retirada do número dos golpistas do resultado das buscas sobre a pousada.


— Abrimos uma ação na Justiça por violação da marca, e a Vara de Fernando de Noronha reconheceu a fraude, determinando providências como a notificação do Ministério Público e o bloqueio da conta dos golpistas — afirma. — A pousada tem tentado tratar os casos de maneira a minimizar o prejuízo das famílias e acolhê-las, inclusive com preços diferenciados. O golpe também impacta a pousada, pois atinge a imagem do estabelecimento.


O que diz o Google

Procurado, o Google informou que o perfil de empresas na plataforma permite que elas “gerenciem diretamente suas informações, como telefone, endereço e horário de funcionamento”. O buscador tem um canal específico para denúncias de dados incorretos, adulterados, desatualizadas ou suspeitos (https://support.google.com/business).


Usuários podem sugerir a edição de perfis de terceiros. “Reforçamos a importância de os usuários verificarem atentamente as informações antes de realizar pagamentos, como por exemplo, consultar o site oficial da empresa e confirmar os dados do beneficiário”, diz o comunicado do Google.


Como escapar de armadilhas

Canais oficiais: A principal recomendação é entrar em contato com o hotel pelos canais oficiais. O mesmo vale para as companhias aéreas e de ônibus. No site da empresa, veja se a URL está correta e sem erros de grafia ou símbolos especiais.


De olho na reputação: Busque por avaliações de outros turistas que já se hospedaram ou contrataram serviços do estabelecimento, tanto nas redes sociais como em plataformas reconhecidas no setor, como TripAdvisor e Booking.com.


Oferta boa demais? Nas compras on-line, é preciso desconfiar de ofertas muito abaixo do mercado. E atenção com sorteios ou anúncios que prometem passagens ou hospedagem muito baratas ou até de graça, mas que exigem dados pessoais. Segundo a empresa de cibersegurança Kaspersky, a tática serve para o roubo das informações.



Verificação: Outro recurso importante é o Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), portal do Ministério do Turismo que reúne obrigatoriamente as informações de profissionais e estabelecimentos do setor. No site, é possível buscar pelo nome de hotel, pousada, agência e guia de turismo e empresas de transporte e checar os dados. Segundo a pasta, isso garante que o prestador está legalmente habilitado a atuar, minimizando riscos de contratar serviços irregulares.


Ponto a ponto: É essencial exigir um contrato de prestação de serviços, onde estejam detalhados os itens incluídos, as condições de cancelamento e possíveis penalidades. Também é recomendado guardar comprovantes, recibos e materiais promocionais.


Por 

 — Rio de Janeiro

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