quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Selic deve entrar em 2025 acima de 11% e ficar lá por bom tempo, dizem economistas

 

                                            Adriano Machado/REUTERS


O novo ciclo de alta de juros iniciado nesta quarta-feira (18) deve jogar a Selic para acima de 11% em 2025 e deixar a taxa básica de juros nesse patamar por alguns meses, segundo economistas consultados pela Folha.


O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central elevou os juros em 0,25 ponto percentual, de 10,5% para 10,75% ao ano, na primeira alta feita durante o terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).


A decisão veio em linha com o esperado por agentes de mercado e trouxe mensagem aberta do Banco Central com relação a ações futuras. O comunicado foi encarado como duro por analistas.


"O Banco Central deixou claro que a magnitude total do ciclo de alta vai depender da evolução de indicadores e expectativas", diz Silvio Campos, economista-sênior da consultoria Tendências. "Vai precisar de mais Selic para fazer a inflação chegar à meta de 3%", diz o economista.


A Tendências projeta que a Selic chegue a 11,75% no fim desse ano e a 12% até janeiro do ano que vem, voltando a 10,5% ao final de 2025.


Mais cedo nesta quarta, o Fed, banco central dos EUA, cortou as taxas de juros nos Estados Unidos em 0,50 ponto percentual, para a faixa entre 4,75% e 5,0%. A primeira redução nas taxas desde 2020 iniciou o que se espera ser um ciclo de alívio constante da política monetária.


O ministro da Fazenda Fernando Haddad (PT) afirmou que esperava que o movimento do banco americano tivesse acontecido em junho, mas que, mesmo "atrasada", a autoridade deve entrar em trajetória de cortes duradoura.


"Não acredito que em 2025 ou 2026 nós tenhamos surpresas, o que é ótimo para o Brasil e o mundo. Isso dá um alívio doméstico grande e nos coloca uma responsabilidade de continuar fazendo um trabalho de arrumação de casa para acolher os frutos desses ventos favoráveis", disse.


O Bank of America classificou a decisão do banco central americano como "hawkish" (dura), afirmando que a medida serviria mais como um ajuste da política monetária, do que o início de um ciclo agressivo de cortes. A casa acredita que, pressionado, o Fed poderá fazer cortes de mais 0,75 ponto percentual no quarto trimestre e 1,25 ponto percentual em 2025.


Para Thaís Zara, economista sênior na LCA Consultores, o aumento da diferença entre os juros dos EUA e Brasil pode trazer um aumento de capital para o cenário doméstico.


"Causaria um câmbio mais apreciado [valorização do real], o que ajudaria a inflação a voltar mais para próxima da meta, mas não muda o fato de o BC mostrar preocupação com atividade econômica".


Isso não deve reverter o ciclo de altas por parte do BC. Para a economista, a questão fiscal ainda pesa no cenário brasileiro, e a autarquia precisaria de confiança em superávits primários constantes para mudar a postura.


"É possível que entreguemos resultado primário dentro da meta neste ano, mas no limite inferior, com exceções e contando com várias receitas extraordinárias. Fica incerteza para próximos anos", diz.


A LCA projeta um ciclo total de 1,50 ponto percentual de aumento na taxa básica de juros. Em um cenário com quatro aumentos, contando com o desta quarta-feira, o BC deve subir a Selic em 0,5 ponto nas próximas duas reuniões e 0,25 ponto na derradeira, chegando a 12% ao ano antes de abril do ano que vem.


"O Banco Central está atado ao cenário fiscal, que teria que dar sinal positivo para vermos o juro baixando. Assim como vimos em 2016 e 2017, após regra do teto de gastos, quando a Selic chegou a 6,5%", diz Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.



A Selic poderia chegar a 11,5% no primeiro trimestre do ano que vem, após três reuniões, e ficaria nesse patamar "por bastante tempo", na visão do economista.


"Vejo os próximos dois anos com Selic acima de 10%", diz.


A decisão foi unânime entre os membros do colegiado, com Gabriel Galípolo –indicado por Lula ao comando do BC em 2025– alinhado ao atual chefe do BC, Roberto Campos Neto.


O comitê diz que o cenário demanda um política de juros mais contracionista, ou seja, que ajude a frear a força da atividade econômica em busca do controle da inflação.


Além disso, justifica a opção citando a resiliência da economia brasileira, pressões inflacionárias, expectativas distantes da meta perseguida e o hiato do produto positivo (margem que a atividade tem para crescer até atingir sua capacidade máxima).


"Há um ciclo que foi iniciado na nossa perspectiva de novas altas para reuniões de novembro de dezembro em 0,25 ponto percentuais para ambas, encerrando o ano em 11,25%", diz Gustavo Sung, economista- chefe da Suno Research.


A unanimidade dos votos reduz ruídos e incertezas que podem ter no futuro com a nova gestão de Galípolo, de acordo com Sung.


"Os diretores indicados do governo vem seguindo uma decisão técnica", afirma.


A Força Sindical publicou uma nota repudiando o aumento de juros por parte do BC, classificando a alta da Selic como um "prêmio aos especuladores". A atual política econômica estaria destoando dos anseios da classe trabalhadora e iria atrapalhar campanhas salariais, segundo a organização.


"Elevar os juros nesse momento traz mais incertezas. O aumento dos juros tende a desestimular o investimento e o consumo no país", diz a nota.


A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, se manifestou nas redes sociais, afirmando que não via justificativas para o aumento.


"Além de prejudicar a economia, vai custar mais R$ 15 bilhões para a dívida pública. Dinheiro que sai de educação, saúde, meio ambiente para os cofres da Faria Lima", disse.

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