sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Maconha legalizada nos EUA traz benefício econômico, mas tem custo social, diz estudo

 

                                          Getty Images via AFP


Estados que descriminalizaram uso recreativo registram aumento de renda, mas veem mais casos de transtornos por uso de substâncias e crescimento da população em situação de rua



A legalização do uso recreativo da maconha em alguns estados dos EUA gerou ganhos econômicos, mas também está associada a custos sociais significativos.


Um estudo realizado pelo Federal Reserve Bank de Kansas City revelou que a medida gerou aumento da renda per capita e mais empregos, mas também levou a uma alta de registros de transtornos por uso de substâncias e ao crescimento da população em situação de rua.


A pesquisa analisou dados de todos os 50 estados americanos ao longo de duas décadas (de 2000 a 2021) e comparou os 24 (além do distrito de Colúmbia) que descriminalizaram a maconha recreativa com os demais que não o fizeram. Os resultados indicaram que, apesar dos benefícios à economia, os formuladores de políticas devem considerar os impactos sociais ao decidir sobre o assunto.


A renda per capita nos estados de uso legalizado da cânabis aumentou em média 3% no período analisado, sugerindo que a atividade em torno da maconha incentivou o empreendedorismo e a criação de empresas. Os preços dos imóveis também tiveram alta, chegando a subir em média 6%, com uma demanda maior por habitação nesses locais que permitiram a venda. Esse aumento é atribuído a um crescimento da população, especialmente nos estados pioneiros na legislação, como Colorado e Washington, ambos em 2012.


A legalização gerou postos de trabalho, especialmente em setores relacionados à produção, venda e comercialização de maconha. Além disso, o turismo derivado do consumo também contribuiu para o crescimento econômico.


Por outro lado, a pesquisa identificou um aumento de 17% nos casos de transtornos por uso de substâncias químicas nos estados em que se descriminalizou o uso recreativo da cânabis, o que sugere um consumo maior de outras drogas.


Outra decorrência atribuída à legalização foi o crescimento do número de pessoas vivendo nas ruas, que foi de 35% no intervalo de 2013 a 2020, considerando o primeiro ano de entrada em vigor da legalização nos estados que inauguraram a medida. Embora o estudo não tenha registrado uma mudança expressiva nas taxas gerais de criminalidade, houve alta de 13% de prisões por crimes violentos e contra a propriedade.


Os efeitos sobre a saúde pública foram mistos. As mortes por acidentes de trânsito subiram 4%, embora as hospitalizações e óbitos relacionadas ao uso de drogas tenham mostrado uma tendência de declínio.


O estudo gerou um debate entre economistas nos EUA. Em sua coluna na Bloomberg, Tyler Cowen, professor da Universidade George Mason, argumentou que legalizar a maconha pode não ter sido uma boa ideia, e estados que ainda não o fizeram deveriam pensar duas vezes. "Não ficaria surpreso se alguns governos decidissem encerrar seus experimentos com a legalização da maconha. A menos que você seja um usuário responsável, como exatamente isso te beneficia? Olhando apenas para as questões práticas, qual é o argumento a favor da legalização?".


Para o economista David R. Henderson, do Hoover Institution, o levantamento confirma um benefício importante da legalização. Segundo ele, custos associados à medida recaem mais sobre quem se beneficia do acesso à droga, ou seja, os usuários. Quando ela é ilegal, por outro lado, Henderson afirma que a guerra contra o tráfico impõe custos a pessoas que não têm nenhuma conexão com o uso de entorpecentes.


De forma semelhante, Scott Sumner, da Universidade Bentley, vê pontos positivos. "O argumento mais forte para a legalização da maconha é que é cruel mandar pessoas para a prisão por vender ou consumir maconha. Após a legalização na Califórnia, o número de pessoas presas por delitos relacionados à maconha caiu drasticamente", escreveu.


Uma crítica à abordagem do estudo está no fato de ainda haver muitas restrições à maconha em âmbito federal, o que pode influenciar nos resultados. No livro "Can legal weed win?", os economistas Robin Goldstein e Daniel Sumner afirmam que o grau de regulamentação oficial e os impostos sobre a produção da erva legalizada acabam por manter o mercado ilegal, o que pode distorcer a realidade sobre o consumo nos estados onde houve a descriminalização.


Daniel Buarque

Folha de São Paulo

Nenhum comentário: