Vencedor do prêmio Olho de Ouro como melhor documentário no Festival de Cannes 2016, “Cinema Novo”, de Eryk Rocha, concretiza um diálogo de gerações e um olhar profundo sobre um dos períodos mais inovadores do cinema brasileiro, em que se destacam realizadores como seu pai, Glauber Rocha, ao lado de Nelson Pereira dos Santos, Cacá Diegues, Paulo César Saraceni, Joaquim Pedro de Andrade, Gustavo Dahl e vários outros.
O filme estreia em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Florianópolis, Fortaleza, Goiânia, Maceió, Niterói e São Luiz.
O tema da paternidade, literal e figurado, percorre, aliás, as belíssimas imagens do longa, valorizadas pela montagem qualificada de Renato Vallone.
Montador e diretor, trabalhando em parceria, buscaram, mais do que uma organização temporal ou didática, dar um sentido à escolha de cenas entre 500 horas de material, incluindo os filmes dessa geração iluminada de cineastas e materiais de arquivos diversos, nacionais e internacionais -- alguns deles inéditos, como alguns pertencentes ao Institut National Audiovisuel (INA) da França.
Foram consumidos nove meses na montagem e outros três na edição de som, em um projeto que foi iniciado nove anos atrás.
A noção de pertencimento norteia boa parte dessa montagem singular de “Cinema Novo”. Assim, Eryk toma a decisão polêmica de incluir nessa turma de renovadores da época um ramo paulista, Walter Hugo Khoury --que é visto em algumas imagens do filme-- e Luiz Sergio Person -- lembrado pela inclusão de trecho de seu filme “São Paulo S.A.”.
A opção de inserir Person, que teve várias brigas com alguns cinemanovistas, como Glauber, foi justificada por Eryk quando da exibição de seu filme na abertura do Festival de Brasília, em setembro: “Todos aqueles cineastas faziam parte do mesmo caldeirão, do mesmo desejo de renovação. Olhando para trás a partir de 2016, aquelas brigas entre eles ficam menores. Meu filme não tem um viés historicista e sim inclusivo. Houve um desejo de nossa parte de trazer essa energia. E depois quem pode dizer o que era e o que não era Cinema Novo?."
Essa ruptura com o historicismo é traduzida também na escolha do realizador de incluir filmes como “São Bernardo” (71), “Iracema” (74) e “Eles não usam black-tie” (81), que cronologicamente ficariam, a rigor, de fora do espectro temporal do Cinema Novo, mas certamente guardavam integralmente seu espírito.
Fora isso, houve uma preocupação em privilegiar materiais que dialogassem com a contemporaneidade. Dispensando usar imagens recentes (como diversas entrevistas feitas entre 2007 e 2015 com cineastas, inclusive Paulo César Saraceni, morto em 2012), o diretor procurou criar no filme um espaço para que o espectador fizesse perguntas sobre temas como afetos e projetos coletivos.
Eryk admitiu que sua geração --ele tem 38 anos-- sempre se sentiu mais próxima não do Cinema Novo, mas do chamado Cinema de Invenção, representado por Julio Bressane, Rogério Sganzerla, Andrea Tonacci e outros – que, na visão pessoal dele, seriam uma “segunda dentição” do Cinema Novo. Mas a própria crise política recente do Brasil o foi aproximando da crise vivida pelo Cinema Novo, especialmente a partir do AI-5, em 1968, que dispersou o grupo.
Para quem desejar mais informações sobre o movimento e seu tempo, o longa “Cinema Novo” vai gerar um subproduto. Foi produzida também uma série de seis episódios de meia hora cada um para o Canal Brasil sobre o mesmo tema, que provavelmente irá ao ar até o final do ano.
(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)
* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb
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