domingo, 2 de fevereiro de 2025

Brasileiro troca avião por ônibus por preço menor, mimos e viagem junto com o pet

 




Assentos que viram cama com direito a cobertor e travesseiro, serviço de bordo, ar-condicionado potente, Wi-Fi, clube de descontos e preços competitivos. Esses são alguns dos diferenciais que os ônibus estão oferecendo para consolidar a preferência dos passageiros que fugiram das altas tarifas dos aviões para as rodoviárias nos últimos anos. E os mimos se estendem até mesmo aos animais de estimação. Em muitas viações o pet pode ir juntinho do tutor.


Os investimentos das companhias do setor, que incluem a renovação da frota, estão dando resultados. Segundo os dados mais recentes da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), 33 milhões de passageiros embarcaram em ônibus interestaduais entre janeiro e novembro do ano passado, alta de 10% em relação ao mesmo período de 2023. O preço parece falar mais alto. Apesar da redução de 22,2% dos bilhetes aéreos em 2024, em 2023 a alta havia sido de 47,2%, segundo dados do IBGE. Já nos rodoviários interestaduais, o aumento acumulado em dois anos foi de 12,9%. Ainda assim, as novas comodidades pesam na decisão de muitos passageiros.


O pintor industrial Elisson Silvano dispensou o avião para ir do Rio a São Mateus, no Espírito Santo, de ônibus com a mulher, Jennifer Ribeiro, e o cãozinho Café, que fez sua primeira viagem numa gaiola sem se separar da família.


— O processo foi rápido. Demos entrada na solicitação por e-mail, levamos no veterinário, atualizamos o cartão de vacina e enviamos a documentação. A autorização saiu no mesmo dia — conta Silvano, lembrando que, no avião, Café teria de viajar no porão e ele teve receio depois da repercussão da morte de um cão em um voo em 2024.


Pontos imitam milhas

Nem todas as empresas permitem cães e gatos. Nos ônibus de 1001, Expresso do Sul e Cometa, do Grupo JCA, é possível embarcar com até dois animais em gaiolas, com atestado sanitário recente de um veterinário e cartão de vacinação. E o pet só precisa pagar passagem em viagens no estado de São Paulo. O acesso é franqueado para outros destinos.


Outra novidade está nos clubes de fidelidade, que imitam as milhas aéreas. Quem viaja mais acumula pontos que dão descontos em novas passagens ou upgrade. Sim, alguns ônibus agora têm classes distintas em relação ao conforto. A pesquisadora paulistana Marina Quintal é uma das adeptas dos leitos e já conseguiu viajar pela metade do preço com pontos.


—Com a fidelidade, nunca pago o valor completo. Fora dos períodos promocionais, economizo de 15% a 20%. Nas promoções, os descontos vão de 40% a 50% na comparação com o site — diz Marina, que vai sempre de São Paulo para Curitiba e Rio dormindo no leito-cama em rotas noturnas.


No Clube Giro, que reúne as viações do JCA, a gamificação é a principal estratégia para reter os passageiros. Quem cumpre missões do app passa de nível e ganha mais pontos.


— Conforme o passageiro interage com os desafios ele evolui no game, e não só quando compra passagem ou viaja, mas também em tarefas como assistir um vídeo do passo a passo para embarcar menores, por exemplo. Avançando, o cliente desbloqueia descontos, passagens de cortesia ou prêmios de outros parceiros — explica Márcia Martinez, que dirige o Giro, acrescentando que houve um aumento de 50% no número de adesões de passageiros no ano passado, elevando a base de usuários a 2 milhões, metade ativa.


Para além do preço menor que o do avião, Marcus Quintella, professor da FGV Transportes, vê uma mudança na experiência de viajar de ônibus no Brasil:


— As empresas adotaram uma estratégia de competir com o avião, que foi muito positiva, em viagens de até 800 quilômetros. Houve modernização da frota, rodoviárias estão melhores, há salas VIP. As paradas nas estradas, que antigamente eram sujas e superlotadas, hoje são boas. Há programas de fidelização. O sistema melhorou, e isso vem dando uma repaginada no setor.


Para representantes das companhias de ônibus, 2024 foi o ano em que o setor superou a retração da pandemia.


— Ainda em 2023, havia regiões onde a demanda não tinha retomado o patamar pré-pandemia. Ainda vínhamos sofrendo essa mudança de comportamento. Foi o primeiro ano em que o baque foi superado — diz Letícia Pineschi, conselheira da Abrati, associação de empresas do ramo.


A conveniência da compra de passagens on-line em vez das filas em guichês de rodoviária também ajuda, destaca a professora paranaense Gabriela Moura, que venceu de ônibus quase mil quilômetros entre Londrina (PR) e Rio, onde foi visitar a irmã na virada do ano. Além de mais barato que o avião, o veículo a agradou:


— Comprei pelo site da companhia e foi bem fácil e rápido. Optei pelo leito. Vou deitada e me sinto bem confortável.


— Os veículos estão mais sofisticados, e as empresas investem cada vez mais em tecnologia e serviços de bordo — diz Ruben Bisi, presidente da Fabus, associação que reúne fabricantes de ônibus. — Além de poltronas mais confortáveis, há menor ruído e vibração interna (nos veículos novos) por conta de investimentos em vidros curvos, com maior espessura. Os sistemas de segurança mecânica também mudaram. Há sensores internos para equilibrar a temperatura e até lâmpadas ultravioletas que matam germes.


Cada vez mais comum nas estradas, o modelo double decker, de dois andares, permite às viações oferecer três tipos de serviços no mesmo veículo. As classes são definidas pela reclinação da poltrona. Os mais caros são os assentos que se abrem em 180º, formando uma cama, com direito a cobertor, travesseiro e até lanchinho temático, como os que vêm numa caixinha em formato de ônibus.


— Virou uma opção interessantíssima em muitas regiões, como a ponte Rio-SP, em que você dorme numa cidade e acorda na outra — diz Bisi.


Os novos atrativos podem ajudar a minimizar os impactos que o turismo teme em 2025 com a expectativa de alta da inflação e dos juros, dificultando investimentos na frota e o acesso dos clientes ao crédito, avalia Letícia Pineschi:


— Quando há retração na economia, classe C e D, que alimentam o setor, são as que mais sofrem. O que conseguem cortar do orçamento são viagens. Com outros modais muito mais caros, não acredito que haja retração tão grande.


Como viajar com bichinhos

Algumas viações permitem animais de estimação na cabine de passageiros, junto do seu tutor. Os protocolos geralmente autorizam a entrada no ônibus de cão ou gato de até 10 quilos. Não há limite para cães-guia de pessoas com deficiência visual.


É necessária autorização?

É preciso apresentar a carteira de vacinação atualizada e atestado recente de um veterinário. Algumas companhias cobram medicação tranquilizante para o transporte do pet sem que ele incomode outros passageiros. Informe-se no site da empresa.


Como devo transportá-lo?

Os animais precisam estar nas tradicionais gaiolas, caixas de transporte apropriadas para seu tamanho, sem alimentos no seu interior. As medidas da caixa variam, mas devem ser próximas de 41 cm de comprimento, 36 cm de largura e 33 cm de altura. Não é permitido o transporte no colo. Só é autorizada a saída do animal da gaiola nas paradas, no exterior do ônibus.


É preciso pagar passagem?

Em algumas rotas, as caixas podem ir ou ao chão, como uma mala, ou sobre a poltrona vizinha, como um passageiro. Nesse caso, é preciso comprar um bilhete para o animal. A regra varia de estado para estado.


Há alguma restrição?

Não há regra geral, logo a verificação deve ser feita com a viação. Geralmente, em rotas longas, de mais de um dia, o transporte do pet é vedado. Para levar outros animais que não cães e gatos, é necessário autorização especial de veterinários cadastrados ou do Ibama, em caso de espécies silvestres.


o globo

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