MARCUS PRETO
Colaboração para a Folha
Resguardada na segurança de sua casa, no condomínio onde vive há dois anos, na Granja Viana, em Cotia, Rita Lee nem parece a rainha roqueira. Ali, seu tempo passa devagar, enquanto rega as dezenas de orquídeas que, organizadas sobre uma mesa, dividem a sala em dois ambientes.
Cuida da horta, planta, colhe. Dá comida às carpas e às tartarugas que moram no lago ao lado da sua janela. E entra muito pouco no pequeno estúdio construído no quintal.
"As turnês continuam intensas. Quando volto pra casa, a música não toma muito tempo da minha vida", diz.
Rita não abria essa intimidade perfumada de incenso há pelo menos 12 anos, quando optou por responder a jornalistas apenas por e-mail. Mas agora alguma coisa mudou.
Marisa Cauduro/Folha Imagem | ||
A cantora e compositora Rita Lee, que acaba de lançar disco ao vivo, posa em sua casa em Cotia (SP) |
Está divulgando seu "Multi-show Ao Vivo" --pacote de CD e DVD que registra a turnê de seu show mais recente. E, pela primeira vez em todo esse tempo, recebe um repórter em sua sala de estar.
"Foi um lapso, uma guarda baixa", brinca. "Por e-mail continua sendo muito mais confortável --tanto para o jornalista quanto para mim. Ele não pega trânsito, eu não tenho que passar batom, é muito mais fácil."
Apesar da gripe forte, fuma um cigarro atrás do outro. É o único vício que diz não ter largado depois de experimentar quase todos. Enquanto conversa, pega no colo algum de seus cinco gatos --que, pode-se notar, convivem pacificamente com os cinco cães da casa.
Há exatos 30 anos, Rita começou essa nova vida. Na contracapa de seu LP de 1979, aparecia grávida e, postura emblemática, apoiava seu corpo sobre o do marido, Roberto de Carvalho. A maior roqueira do Brasil havia se tornado, como costumavam dizer na época, uma "mãe de família".
"Antes do Roberto, eu era boy total. Coçava saco. Sempre andei com menino, de carrinho de rolimã", lembra. "Eu tenho um pé na sapataria. Todo mundo tem um pouco, eu acho. Mas, no meu caso, minhas inspirações eram sempre masculinas: Bowie, Jagger..."
Depois que conheceu Roberto, sua feminilidade subiu para o primeiro plano --inclusive na música. "Comecei a passar batom, usar sutiã. Foi uma descoberta", afirma.
Junto, veio o sucesso popular. Todas as faixas desse álbum de 1979 emplacaram no rádio. Entre elas, "Mania de Você", "Doce Vampiro" e "Chega Mais". Era só o começo.
"Rita tinha constrangimento do sucesso", diz Roberto. Ela interrompe o marido: "Ainda acho que, em qualquer arte, tudo fica melhor se o artista tiver um pouquinho que seja de sofrimento, do lutar, daquela coisa romântica. Quando é muito dinheiro no banco, algo está errado para o artista".
Bem, 30 anos depois dessa guinada e tantos discos de ouro acumulados, Rita não é exatamente o que podemos chamar de pobretona. Como combustível para fazer música, diz não precisar mais desse "sofrimentozinho necessário". Agora, fala do mundo que vê.
"É uma coisa de idade. Você atinge essa serenidade de observar melhor", diz. "O jeito que eu via os meus meninos pequenininhos era bem diferente do jeito que vejo minha neta. Estou gostando mais agora."
Mutante
Ela conta que o corpo reclama um pouco, "principalmente meu fígado e minhas hérnias de disco". Mas faz semanalmente tratamento com medicina ortomolecular e tem sentido bons resultados.
"Estou ótima para 61 anos. Agora sou uma meditante. Em vez de mutante, meditante."
Nada mal para quem, aos 28, tinha certeza que estava no fim da vida. "Nossa, eu lembrava de quando era pequena e via minhas tias balzaquianas como se elas fossem seres pré-históricos. Quando fiquei trintona, quase pirei", conta. "Mas logo descobri que, depois dos 30, a gente libera geral e vai voltando, fica cada dia mais nova. Igual ao filme do Brad Pitt."
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