Não é novidade o IFMS (Instituto Federal de Mato Grosso do Sul) ser premiado na Febrace (Feira Brasileira de Ciências e Engenharia), promovida há mais duas décadas pela USP (Universidade de São Paulo). Premiações ocorrem desde 2012, primeiro ano de participação da instituição no evento.
Mesmo assim, a edição 2024 - realizada entre 18 e 22 de março, na capital paulista - passa a ter um significado especial. Pela primeira vez, o IFMS trouxe para casa o 'Prêmio Professor Destaque', ou melhor 'Professora Destaque'. Karina Vicelli, docente do Campus Dourados, era a única finalista de Mato Grosso do Sul, e concorria com outros nove professores da Bahia, Piauí, Rio de Janeiro, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe.
Criado há 12 anos, o prêmio tem por objetivo reconhecer, valorizar e homenagear os professores pela dedicação. A seleção foi feita por um comitê, junto a orientadores e coorientadores que participaram da feira. Os candidatos também puderam se apresentar no evento, como parte da programação oficial. A vencedora foi definida por meio dos votos e pelo desempenho dos orientandos na Febrace que, no caso de Karina, foram as estudantes Ana Júlia Leite e Edilaine Rocha. A dupla apresentou o projeto 'Escritoras no Mato Grosso do Sul', também premiado.
Karina é docente de Língua Portuguesa do IFMS desde 2015, e ocupa o cargo de coordenadora de Pesquisa e Inovação no Campus Dourados. Para ela, ter recebido o prêmio é o êxito de uma luta e um trabalho que começaram há quase três décadas.
"Comecei a dar aula em 1995. Antes de ser formada professora de literatura, eu já era professora. Então é ensinar e aprender o tempo todo. Como diria Paulo Freire, todo mundo tem alguma coisa a aprender, todo mundo tem alguma coisa a ensinar, não tem ninguém que não saiba nada, todo mundo sabe alguma coisa. E eu amo dar aula!".
Mais que uma vitória, ser 'Professora Destaque' na Febrace 2024 também tem outros significados para a docente.
"Quando você ganha um prêmio desse, vem a responsabilidade junto, mas ele me mostra que estou no caminho certo, e vou continuar fazendo o meu melhor pela educação deste país. E sim, o Brasil tem jeito! Eu acredito nisso pelo empoderamento por meio da palavra, da escrita, dos estudos literários, e quanto mais narrativas nós trocarmos, mais fortes nós ficamos, mais potentes nós somos e mais vozes nós poderemos ouvir".
Por ser "cria" da universidade pública, tendo feito graduação, mestrado e doutorado gratuitamente, Karina sente que é seu dever devolver, de alguma forma, todo o investimento em sua formação.
"Eu me sinto na obrigação de devolver à sociedade aquilo tudo que foi investido em mim, e dar voz a quem ainda não tem voz, levar educação a quem realmente precisa. Também continuar empoderando quem mais precisa, as meninas, as mulheres, indígenas, cultura afrodescendente, a comunidade LGBTQIA+, todo e qualquer estudante periférico que não tem tantas oportunidades", ressalta.
Escritoras no MS - O projeto desenvolvido no Campus Dourados, sob orientação da professora Karina, recebeu na Febrace 2024 o 2° lugar da categoria Ciências Humanas e o Prêmio Destaque Unidades da Federação, que reconhece o melhor trabalho de cada Estado.
Por meio do projeto, é realizado um mapeamento de mulheres que já publicaram e publicam em Mato Grosso do Sul, ou sobre o Estado, ou que têm alguma relação de estudos ou trabalho com o MS, ou também vínculo afetivo. O objetivo é dar visibilidade à escrita feminina, tanto no que se refere a texto literário quanto científico. As estudantes participantes desenvolveram um banco de dados on-line para a divulgação do trabalhos dessas mulheres.
Inicialmente, o trabalho foi desenvolvido por quatro estudantes do curso técnico integrado em Informática para Internet: Ana Júlia Leite, Ana Laura Garcia, Edilaine Rocha e Maria Clara Maciel, todas agora egressas do IFMS. Na mostra de finalistas da Febrace, realizada em São Paulo na semana passada, o trabalho foi apresentado por Ana Júlia e Edilaine.
Edilaine, 19, atualmente cursa Relações Internacionais na Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), e explica que os principais objetivos do 'Escritoras no MS' são a luta pela igualdade de gênero, o resgate histórico-cultural do Estado por meio da pesquisa de obras publicadas por mulheres e em como isso pode contribuir para a sociedade.
A pesquisa também aborda o processo de criação desses escritos e as dificuldades que elas enfrentam para publicá-los, principalmente as impostas pela sociedade, como deixar de escrever para cuidar da casa e dos filhos.
“Toda essa experiência me proporcionou a sensação de pertencimento que eu só consegui ter depois de realizar a pesquisa e, com ela, aprender que a desigualdade de gênero pode ser combatida de diversas maneiras. Também pude aprender mais sobre o meu local, sobre a história da minha cidade, do meu estado e, consequentemente, do meu país. Evoluí e me entendi melhor enquanto mulher graças ao projeto”.
Natural de Jateí, município localizado a 70 quilômetros de Dourados e com cerca de 4 mil habitantes apenas, Edilaine reflete sobre o que enfrentou para conseguir cursar o técnico integrado ao ensino médio no IFMS. A rotina exaustiva de três horas diárias no transporte intermunicipal, os almoços e jantares longe da família e as dificuldades para conciliar as disciplinas regulares com as do curso e mais as atividades extracurriculares.
"Mas tudo valeu a pena. Todas as dificuldades que enfrentei para continuar estudando no IFMS me permitiram valorizá-lo ainda mais. Eu me sinto muito grata e orgulhosa por representar não só o IFMS na Febrace, mas também o meu município. Levar o livro da história e cultura de Jateí para o evento foi uma experiência incrível, pois pude mostrar para pessoas de todo o país um pouco da história de onde eu nasci, da minha história, por meio de um livro organizado por mulheres que haviam sido professoras dos meus pais”.
A respeito da influência do projeto, Ana Júlia, 18, aponta que ele vai continuar presente em sua vida. Natural de Fátima do Sul, a jovem atualmente trabalha na área de informática e cursa faculdade de Sistemas de Informação em Dourados.
“Foi essencial construir essa família científica com as meninas e as professoras, para entender o meu lugar como mulher e como pesquisadora. O projeto vai estar sempre presente na minha vida, principalmente porque vou seguir em uma área que não tem tantas mulheres. Toda a pesquisa que fiz no ensino médio me faz querer continuar pesquisando na faculdade, mesmo que outros temas”, explica.
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