Emenda parlamentar é a forma de deputados e senadores enviarem recursos para obras, projetos e compras de bens em suas bases eleitorais
FOLHAPRESS
Às vésperas de deixar o cargo, o presidente Jair Bolsonaro (PL) contrariou o centrão e vetou uma manobra do Congresso que daria sobrevida a quase R$ 10 bilhões em emendas parlamentares que ainda não foram totalmente executadas.
Emenda parlamentar é a forma de deputados e senadores enviarem recursos para obras, projetos e compras de bens em suas bases eleitorais.
Por causa da demora na execução dessas ações (como obras e aquisição de grande porte), é comum que o contrato só venha a ser concluído meses ou até anos após a indicação da emenda.
Pelas regras atuais, as emendas de 2019 e 2020 que ainda não foram totalmente executadas serão canceladas no fim deste mês. O saldo, segundo dados obtidos pela reportagem, é de aproximadamente R$ 10 bilhões -sendo que quase metade é de emenda de relator de dois anos atrás.
A distribuição das emendas de relator fortaleceu principalmente o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que se aliou a Bolsonaro de olho na disputa pelo comando da Casa em 2021.
As emendas de relator eram distribuídas por critérios políticos e de forma pouco transparente. Elas foram declaradas inconstitucionais pelo STF (Supremo Tribunal Federal) neste mês.
O mecanismo permitia que congressistas mais influentes, principalmente do centrão, pudessem transferir mais verba a seus redutos eleitorais do que parlamentares do baixo clero.
Os líderes dos principais partidos do Congresso articularam a prorrogação, até 31 de dezembro de 2023, do prazo para que as emendas de anos anteriores fossem completamente executadas. O dispositivo foi aprovado na semana passada, mas foi vetado por Bolsonaro nesta quarta-feira (28).
A falta de empenho do Palácio do Planalto em auxiliar na execução de emendas de anos anteriores e na liberação de emendas de 2022 -que ficaram bloqueadas por quase seis meses- tem gerado embates entre a cúpula do Congresso e integrantes do atual governo.
O governo afirmou que o veto seria necessário porque a manobra do centrão era inconstitucional. Na justificativa publicada no Diário Oficial da União, Bolsonaro argumenta que a mudança na execução de emendas parlamentares dos anos de 2019 e 2020 não poderia ser feita por um projeto de lei comum.
O governo diz que a mudança, da forma como foi feita pelo Congresso, iria modificar a regra orçamentária de "caráter permanente", ao não considerar a periodicidade anual do orçamento público, e poderia dificultar o controle sobre as despesas.
Antes da decisão do STF, existiam quatro tipos de emendas: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região), as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso) e as do relator (que foram enterradas pelo Supremo).
As emendas de 2019 e 2020 que ainda não foram totalmente executadas se distribuem em todas essas modalidades, apesar de uma concentração maior nas emendas de relator -de interesse do centrão.
Ao analisar o projeto em que constava a manobra do Congresso, Bolsonaro também vetou um artigo para transferir todo o valor restante das emendas de relator de 2022 para o orçamento dos ministérios.
Apesar de deputados contestarem a decisão do governo, técnicos dizem que o veto não inviabiliza o plano de que parte dos recursos ainda seja usado até o fim do ano.
Um exemplo é uma portaria do Ministério do Desenvolvimento Regional publicada nesta segunda-feira (26).
O ato da pasta traz as regras para a execução dos recursos alocados na verba restante do próprio ministério e também na forma de emendas de relator.
A portaria diz que é "vedado o atendimento de solicitações" de deputados federais e senadores, além da Comissão Mista de Orçamento do Congresso. Ou seja, a pasta diz que poderá executar os valores classificados como emendas de relator, mas sem seguir os critérios dos parlamentares para distribuição dos recursos.
As emendas de relator deste ano somam R$ 16,5 bilhões. Desse total, R$ 7 bilhões já passaram por todo processo orçamentário e, portanto, foram concluídas ainda em 2022.
Ainda há cerca de R$ 1,5 bilhão dessas emendas que foram empenhadas (foi feita a reserva no Orçamento para esse gasto).
Porém, como a execução não foi concluída, a equipe de Bolsonaro quer cancelar essas emendas, o que também irritou parlamentares.
O restante das emendas de relator -cerca de R$ 8 bilhões- foi bloqueado pelo governo por falta de espaço no Orçamento.
Esse valor não foi usado nem empenhado antes da decisão do STF. Portanto, o governo ainda discute o que fazer com essa verba.
O Congresso aceitou transferir R$ 3,8 bilhões desse dinheiro para outras áreas, como para o cumprimento da Lei Paulo Gustavo, que prevê a transferência desses valores para estados e municípios ajudarem o setor cultural a se recuperar da crise causada pela pandemia.
Bolsonaro sancionou nesta quarta a liberação da verba para a Lei Paulo Gustavo. Aliados de Arthur Lira dizem que o presidente da Casa tinha o plano de usar o restante da verba para atender, com recursos dos ministérios, a pedidos de emendas de deputados. Mas há resistência no Palácio do Planalto em viabilizar esses acordos políticos.
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