Por FOLHAPRESS
Do experiente articulador político José Sarney não se espere análises conjunturais nem históricas ou juízo de valor sobre aliados e adversários neste trepidante 2018.
O ex-presidente que se tornou conselheiro de seus sucessores escolheu revelar uma faceta bem-humorada de contador dos causos que coleciona ao longo de 87 anos, com a pena leve e atenta às ironias da vida.
Para os primeiros meses do próximo ano eleitoral, Sarney prepara o seu 120º livro, provisoriamente intitulado "Galope à Beira-Mar", inspirado no nome dado a um dos ritmos dos cantadores do Nordeste. Os personagens da vida pública recente do país quase todos estarão contemplados, mas não em sua versão noticiosa.
O decano da Academia Brasileira de Letras preferiu se ater a detalhes, às graças e "às voltas que a política dá" -como deu quando Fernando Collor ouviu de Ulysses Guimarães um sonoro não ao pedir para ser seu vice na chapa presidencial de 1989. Perdeu Ulysses, ganhou Collor.
É verdade que Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff preencherão menos linhas que Luiz Inácio Lula da Silva, mas definitivamente não por critérios eleitorais.
A julgar pelas circunstâncias atuais, Michel Temer teria lugar destacado em um livro sobre o Brasil contemporâneo na visão de Sarney, que acabou por se firmar como um de seus mais vividos interlocutores. Mas, nessas linhas, o atual presidente da República não aparece.
Aparecem, aí sim, relatos de família, da infância em Pinheiro, no interior do Maranhão, e da juventude em São Luís. Cenas da política em Brasília, em Cuba, no Vaticano e outros cantos também, porém em seu viés anedótico.
"Neste livro, a prosa de Sarney mira o avesso de qualquer pretensão, seja literária, seja política", observa Rodrigo de Almeida, editor de "Galope" na Casa da Palavra/Leya.
"São histórias de quem tem boa memória e um gosto especial pela conversa. Um 'causeur' que, por acaso, observou, ouviu e protagonizou histórias e estórias em décadas de vida pública. Grandes personagens em pequenas histórias, ou pequenas personagens em grandes causos."
FORTUNA CRÍTICA
O autor de "O Dono do Mar" e "Marimbondos de Fogo" explora, já no prefácio, a extensão de títulos possíveis para a nova obra. "Livro dos Casos", por exemplo, foi descartado porque o autor o considerou "vulgar". "Casos e Acasos", "Pé de Conversa" e "Conversa Puxa Conversa" tampouco sobreviveram à crítica sarneysiana.
Zeloso de sua trajetória literária, o autor a cultiva há tanto tempo quanto a sua carreira política. Tinha 23 anos quando publicou na revista que criara, "A Ilha", o ensaio de cunho social "Pesquisa sobre a Pesca de Curral".
Em 1954, aos 24, venceu sua primeira eleição, para a Câmara dos Deputados, ao mesmo tempo que lançou o seu primeiro livro, no caso de poesia, "A Canção Inicial".
Depois de três mandatos na Câmara, elegeu-se governador do Maranhão e, de quebra, lançou sua segunda obra, "Norte das Águas" (1969), ainda no mandato.
E assim foi. Senador, vice-presidente que se tornou presidente, senador de novo e presidente do Senado.
Um total de dez mandatos e 120 títulos, incluindo discursos e planos de governo que ele editou em livros.
Embora pouco estudados, o emedebista esbanja orgulho de seus feitos literários.
Prepara para os próximos dias a impressão privada da compilação de que tudo o que produziu, com comentários críticos das 168 edições de sua carreira até o presente, traduzidas em inglês, francês, espanhol, alemão, chinês, coreano, grego, árabe, russo, húngaro, romeno e búlgaro.
Na "Bibliografia e Fortuna Crítica de José Sarney", foram incluídas as palavras de "intelectuais de expressão universal" como Claude Lévi-Strauss e Octavio Paz sobre a obra de Sarney.
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Ainda muito influente nos bastidores políticos, Sarney tem reservado suas aparições públicas ao universo cultural. Acaba de voltar de Guadalajara, no México, onde fez a "conferência magistral " da Feira Internacional do Livro.
Discorreu sobre "O Livro e a Internet", as evoluções da tecnologia e da literatura.
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