Reuters
O governo federal pôs na rua seu principal projeto, a reforma da Previdência, mas ainda não consegue contar quantos votos teria a favor da proposta e nem mesmo qual seria exatamente o tamanho de sua base parlamentar, em um movimento —ou falta de— que vem deixando assustados líderes experientes.
No Palácio do Planalto, perguntas insistentes sobre o tamanho da base do governo são respondidas com silêncio. Se em tese o governo teve a adesão do PR e a simpatia de outros partidos do chamado centrão ainda durante a transição, na prática, hoje a base é formada apenas pelo PSL, o partido do presidente.
“O governo vai ter que construir a base, hoje ela não existe. O único partido com declaração de base de apoio de governo é o PSL. Não existe nenhum outro que tenha base declarada, mesmo com ministros no governo”, disse o líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir, na semana passada, ao chegar para um café da manhã com o presidente Jair Bolsonaro.
O PSL tem 54 deputados.
Nenhum outro partido declarou apoio oficial ao governo. Alguns que chegaram a negociar uma adesão, como o PR, o PP e o PRB, terminaram por declarar independência e já verbalizam sua insatisfação com a articulação política —ou a falta de— do governo.
“Nós já perdemos o PR, estamos perdendo o PRB, tudo por falta de articulação. Hoje o governo tem 100 votos quando muito para a reforma da Previdência, já teve 250”, reclama uma parlamentar governista. “E não vai resolver dando tapa na orelha de parlamentar.”
A ala econômica prefere não falar em número de votos para a reforma da Previdência, citando apenas dados da ala política do governo, que fala em 250 votos —para aprovar uma mudança constitucional, como a reforma da Previdência, são necessários pelo menos 308 votos.
Deputados experientes ouvidos pela Reuters garantem que não existe hipótese de a reforma ter hoje esses 250 votos. No Planalto, fala-se em algo entre 180 e 200 parlamentares favoráveis, mas parte desses apenas depois de negociações que terão que incluir, mesmo que o governo não queira, cargos.
O mais provável, dizem Parlamentares que conhecem a Casa, é que o número mais firme não passe de 100. Questionado sobre a expectativa do governo e o tamanho da base, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, fez uma conta básica que, na prática, dificilmente se confirma: a de que a oposição conta com 150 deputados e o restante, 363, seriam votos potenciais em favor da reforma.
“AMADOR”
O cálculo do ministro desconsidera o poder de corporações que elegem os parlamentares e as insatisfações das bancadas.
No mesmo dia da apresentação da reforma, os presidentes do PP, Ciro Nogueira (PI), e do PRB, Marcos Pereira (SP), usaram suas contas no Twitter para afirmar que sem o projeto que altera também a previdência dos militares nem se deveria iniciar a discussão do projeto, em um sinal de que a vida do governo não deve ser fácil.
“Atrapalhado” e “amador” são alguns dos adjetivos usados por um líder partidário para avaliar a articulação do governo. Há queixas de parlamentares que pedem audiências e não são recebidos e até de quem foi levar prefeitos de sua região para conversar com secretários e se sentiu destratado.
“Eles acham que estão fazendo tudo novo, mas a verdade é que não tem articulação. Um líder tem que ligar para o ministro, para o presidente e resolver as coisas, ter informação. Nada disso tem”, reclama uma liderança.
Apegado à ideia de que não irá negociar cargos com partidos e líderes partidários, o governo vendeu, esta semana, a ideia de que irá montar um “banco de talentos” de nomes indicados pelos parlamentares para preencher cargos ainda vagos na administração federal.
Como mostrou a Reuters, são cerca de mil vagas para serem preenchidas em órgão federais nos Estados, que deputados e senadores tentam convencer o Planalto que precisam ser negociadas para adiantar a reforma. Onyx defende que parlamentares poderão indicar nomes, que serão técnicos, terão os currículos avaliados e poderão ser vetados pelos ministros.
Seria apenas uma nova versão da distribuição de cargos, avalia uma liderança parlamentar de alto escalão, que tenta amenizar a ideia de “toma lá, dá cá”, tão combatida por Bolsonaro durante a campanha e a transição. “Continua sendo um sistema de indicações políticas”, analisa.
Outra liderança ouvida pela Reuters avalia que o anúncio feito pelo governo como uma novidade é, na verdade, ofensivo aos parlamentares.
“A maneira como eles tratam parece que os partidos só querem meter a mão no governo. Não é assim. Tem gente experiente, boa, que pode ajudar”, reclamou. “Eu que não vou indicar ninguém.”
Na semana passada, a falta de articulação deu mostrar das dificuldades que o governo pode passar.
A Câmara aprovou por 367 votos a 57 a urgência do projeto que sustava o decreto que ampliou a delegação de quem no governo pode definir a classificação de documentos secretos. Logo em seguida o decreto foi derrubado em votação simbólica.
A votação foi vista como um recado de uma Câmara insatisfeita ao Planalto mas, dentro do Palácio, foi avaliado como algo menor.
Reportagem adicional de Ricardo Brito e Marcela Ayres
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