sexta-feira, 6 de dezembro de 2024

Agora vai? Acordo comercial UE-Mercosul deve ser selado hoje no Uruguai após 20 anos de negociações

 



Depois de 25 anos de negociações, a expectativa é que o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia (UE) seja finalmente concluído hoje, durante a reunião de cúpula do bloco sul-americano em Montevidéu. Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia (o braço executivo da UE), chegou ontem à capital uruguaia, o que reforça a perspectiva de conclusão do acordo, que vai criar um mercado comum de mais de 700 milhões de pessoas, com um PIB somado de US$ 22,3 trilhões.


A viagem de Von der Leyen era esperada pelo governo brasileiro desde a noite de quarta-feira, e o clima de expectativa no Itamaraty é grande. O ambiente está “tenso”, confirmaram fontes oficiais, e a decisão, a esta altura do campeonato, é “mais política do que qualquer outra coisa”.


As partes mais importantes do entendimento estão fechadas, caso contrário, frisou outra fonte, “Von der Leyen não teria pego um avião até Montevidéu”. Só faltaria agora “bater o martelo":


— No caso da Comissão Europeia, isso depende de uma decisão política de sua presidente. Se ela viajou, as chances são altíssimas.


Nos últimos dias, negociadores dos quatro países do Mercosul (Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai) têm mantido conversas para avançar na parceria. A decisão de Von der Leyen de participar da cúpula em Montevidéu é um sinal de que é possível chegar a um acordo, disse uma fonte.


“Pouso na América Latina. A linha de chegada está próxima, vamos trabalhar e alcançá-la”, disse Von der Layen na rede social X sobre uma possível conclusão das negociações sobre o acordo, que classificou de “a maior parceria comercial e de investimentos que o mundo já viu.”


Ela se reuniu ontem mesmo com o presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou.


Segundo o ministro uruguaio das Relações Exteriores, Omar Paganini, “todos os países do Mercosul” são a favor do acordo e este “seria fechado” hoje, informou o jornal local El País.


— Vale ressaltar que todos os países se pronunciaram a favor do acordo alcançado com a União Europeia em relação ao texto do acordo de livre comércio — disse Paganini ontem a jornalistas após a reunião de chanceleres do bloco sul-americano.


EUA e China no radar

Para uma fonte que acompanhou as negociações, que pediu para não ser identificada, a eleição de Donald Trump para mais um mandato como presidente do EUA fez toda a diferença para a nova conclusão do acordo.


Isso já teria pesado em 2019, quando foi anunciada a primeira conclusão. Dois anos antes, Trump havia iniciado uma guerra comercial com a China, elevando as tarifas de importação nos EUA.



Na visão dessa fonte, a aprovação do acordo na época teria sido congelada por dois fatores: a repercussão negativa, na Europa, da política ambiental do governo Jair Bolsonaro e a eleição, na Argentina, de Alberto Fernández, contrário à abertura do mercado



No fim das contas, a questão da política ambiental serviria de “desculpa” para o protecionismo agrícola da França, continuou a fonte. E a reabertura das negociações permitiu o recuo, do lado do Mercosul, na abertura de compras públicas — o que favoreceria licitações internacionais para comprar bens e contratar serviços, como obras.


Esse ponto das compras públicas era um obstáculo para os europeus aceitarem a conclusão do acordo em novos termos, mas o receio de perder mercados com a possibilidade de aumento do protecionismo nos EUA parece ter falado mais alto, disse essa fonte.


Agora, a aprovação final dependerá do jogo político de cada país europeu — mesmo na França, conglomerados da indústria e dos serviços, que têm mais peso na economia do que a agropecuária, tendem a apoiar o acordo.


Lia Valls, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), também avalia que a vitória de Trump pode ter impulsionado a diplomacia dos dois blocos para concluir as negociações:


— A Europa não está muito bem. Sair um pouco da disputa entre China e EUA interessa para eles também. Eles têm muitas multinacionais aqui na região, ficam preocupados com a concorrência chinesa.


França e Itália reclamam

A França é hoje a principal oposição ao acordo. Ontem, o presidente Emmanuel Macron — que enfrenta uma crise política em seu país, com a demissão do primeiro-ministro após uma moção de desconfiança do Parlamento — enviou mensagem a Von der Leyen afirmando que o acordo é “inaceitável”.


A Itália também se manifestou contra o acordo ontem. Fontes disseram à agência AFP que “não há condições para apoiar o texto atual”.


Já a Alemanha, que representa cerca de um quinto da população da UE,apoia o pacto, assim como a Espanha.


A decisão de Von de Leyen de ir a Montevidéu indicaria, por um lado, que a França não conseguiu muitos aliados e, por outro, que o medo de fortalecer a extrema-direita europeia — crítica do acordo — foi sobrepujado pelo desejo de aproveitar o que os diplomatas chamam de “janela de oportunidade”.


Para várias fontes, Mercosul e UE “nunca estiveram tão perto de selar o acordo, e provavelmente nunca estarão”.


— O que queremos é concluir as negociações este ano — disse Mauricio Lyrio, secretário do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, que lidera as negociações com a UE. — Estamos otimistas.


O acordo reduz tarifas para a maioria das exportações da UE para o Mercosul, ao mesmo tempo em que abre mais o mercado europeu para importações, inclusive de produtos agrícolas.


(*Com agências internacionais)

Por 

 e 

 — Buenos Aires, Rio e Bruxelas

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