sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Filme : A Tabacaria

Cine web

Em um de seus últimos papeis no cinema, o ator suíço Bruno Ganz, morto em fevereiro passado, interpreta Sigmund Freud no drama-histórico A tabacaria, que se passa na Viena dos anos 1930, ocupada pelos nazistas. Mas, mais do que colocar o pai da psicanálise como personagem, o longa de Nikolaus Leytner é uma investigação freudiana sobre o desejo e a culpa.

A trama começa com o jovem Franz (Simon Morzé) presenciando sua mãe (Regina Fritsch) fazendo sexo vorazmente com o amante encostados numa árvore, enquanto um temporal se arma. Não demora muito, e o sujeito morre quando um raio o atinge dentro de um lago. Leytner já começa o filme carregando no simbolismo, que evocará água – um símbolo da maternidade – em diversos momentos. Depois disso, a mulher manda o filho para Viena, onde irá trabalhar na tabacaria de um antigo amante dela, Otto (Johannes Krisch), que perdeu uma perna na I Guerra Mundial, e não tem qualquer preconceito quanto aos seus clientes, recebendo judeus e comunistas, mesmo que isso implique riscos para ele.

Um dos clientes da loja é exatamente Freud, a quem Franz pede conselhos quando se descobre apaixonado por Anezka (Emma Drogunova), uma jovem com diversos amantes, o que remete o jovem à sua mãe. O psicanalista não se furta de ajuda-lo,  mas isso não é prioridade, visto que o antissemitismo está cada vez mais forte na cidade.

Trabalhando com um roteiro de Klaus Richter e Nikolaus Leytner, a partir do romance de Robert Seethaler, Leytner combina o lado pessoal dos personagens com o momento político-histórico, tentando entender como um influencia o outro. A tomada da cidade pelos nazistas aumenta a violência e a tensão, resultando em algumas das cenas mais impactantes do filme.

Mas o forte aqui, além da reconstituição de época, são os dois atores centrais. Morzé é uma revelação na construção de Franz, um jovem repleto de inseguranças, anseios e pesadelos, se mostrando à altura de Ganz. Este, por sua vez, já havia interpretado Hitler – em A queda! As últimas horas de Hitler, que lhe rendeu uma indicação ao Oscar – e traz à tela aqui um Freud dotado de sabedoria, mas também frágil, vulnerável às forças da história. O resultado é mais um atestado do grande talento do ator suíço.
Alysson Oliveira

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