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quinta-feira, 15 de setembro de 2016
ESTREIA–Dilemas da juventude alimentam clima ambíguo do drama “Mate-me Por Favor”
A primeira impressão pode ser de estranheza, mas como um retrato cinematográfico da adolescência não haveria de traduzir como é estranha esta fase da vida? Valendo-se disto, “Mate-me Por Favor”, primeiro longa-metragem de Anita Rocha da Silveira, aposta no cinema de gênero, com o qual sempre flertou em seus curtas.
Em “O Vampiro da Meio-Dia” (2008), “Handebol” (2010) e “Os Mortos-Vivos” (2012), ela usou signos do terror e elementos sobrenaturais como metáforas de uma população amedrontada.
Essa representação ocorre através de Bia (Valentina Herszage) e seu trio de amigas (Mari Oliveira, Julia Roliz e Dora Friend), cujo cotidiano é abalado, assim como de toda a escola e da comunidade, por uma série de assassinatos de jovens, quase sempre mulheres, na região da Barra da Tijuca.
É uma trama de mistério em que as reações dos personagens importam mais do que a sua simples resolução. Se os casos assustam os moradores do bairro carioca, por outro lado, geram um interesse mórbido na garota de 15 anos que conduz a narrativa ambivalente, entre o naturalismo e surrealismo, numa efervescência de desejos e sentimentos comuns aos adolescentes.
Selecionado no Festival do Rio, na Mostra de Cinema de São Paulo, no Panorama Internacional de Salvador e no Janela em Recife, que exibiram, em 2015, uma bem-vinda safra de filmes adolescentes, “Mate-me...” destacou-se, não só pelos prêmios que recebeu mas pela rápida identificação que cria no público com aquele ambiente escolar.
E isso não só por temas como amor, inadequação, sexo, repressão, violência, dor, moral e religião, mas pela linguagem adolescente e elementos familiares até para quem já passou desta fase.
Vê-se um mundo particular onde os adultos praticamente não existem. A mãe de Bia e João (Bernardo Marinho), seu soturno irmão, é apenas citada. Ouve-se somente vozes no rádio e alto-falantes e até os maiores de idade são retratados como parte desta juventude isolada, na cabeça dos próprios adolescentes, também pela falta de compreensão de quem está fora dela.
Da mesma forma, a escolha pode significar uma ausência de perspectiva de futuro que se comunica com a cena final, igualmente fantasmagórica e libertadora sobre a passagem por esses anos de formação.
Silveira compõe um interessante equilíbrio entre a criação de um cotidiano realista e uma linguagem fantástica, misturando a uma estrutura de “slasher teen” o sarcasmo de “Meninas Malvadas” no retrato animalesco do ensino médio, além do terror psicológico e onírico de David Lynch.
Esses elementos funcionam na difícil tarefa de destrinchar o flerte dos jovens com a morte, que se alimentam da adrenalina de sempre estar perto dela para poderem se sentir vivos, um tema caro e pessoal para a diretora. Essa morbidez se traduz não só no vermelho que invade a tela pontualmente, mas na paleta de cores predominantemente roxa e no trabalho de Valentina Herszage com uma personagem tão complexa.
Não é por menos que ela foi premiada no Rio, no Recife e, em conjunto com as outras meninas, em Veneza, com o Bisato d’Oro, prêmio paralelo concedido pela crítica independente.
As violentas transformações urbanas sofridas pela Barra da Tijuca retratadas em “Mate-me Por Favor”, por sua vez, vão de encontro à preocupação com o espaço urbano que tem transparecido no cinema brasileiro atual. Por isso, ainda que o excesso de informação da obra possa causar ruído, não só representa o caos da adolescência, como também aponta, na pluralidade de leituras pertinentes já em seu début, Anita Silveira como uma voz forte e promessa para o futuro.
(Por Nayara Reynaud, do Cineweb)
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